Conduzida com 37 mil pessoas de 16 países, pesquisa do King’s College London mostrou que o tempo de atividade física estimula o cérebro com efeito semelhante ao de medicamentos
Aliviar mau humor, ansiedade e depressão pode ser menos penoso do que parece. É ponto pacífico que a atividade física faz bem para a saúde física e mental. Porém, uma pesquisa com 37 mil pessoas, realizada em 16 países, entre os quais o Brasil, revelou que cerca de 15 minutos por dia de exercícios — especificamente, 15m09s — proporcionam melhora do bem-estar mental.
Parece e é pouco tempo, mas já representa estímulo para o cérebro humano, ávido por movimento. O cérebro evoluiu para controlar um corpo que deveria estar em constante movimento e, cada vez mais, adoece de sedentarismo, dizem cientistas.
O novo estudo confirma uma série de pesquisas anteriores, que mostram que os exercícios estimulam o cérebro com efeito semelhante ao de drogas contra a depressão e a ansiedade. Em vez de gotas de remédio, gotas de suor. E sem efeitos colaterais.
O líder do estudo, Brendon Stubbs, pesquisador do King’s College London, no Reino Unido, explica que a atividade física influencia numerosos mecanismos neurobiológicos e psicossociais. Chamada State of Mind Index, a pesquisa foi realizada para a empresa esportiva japonesa Asics. O grupo coordenado por Stubbs analisou dados de escaneamento facial e depoimentos de praticantes de atividade física.
— Não importa o tipo de atividade. O movimento pode tomar várias formas e todas oferecem benefícios para a saúde física e mental. Sabemos que exercícios aeróbicos, como corrida, esportes coletivos e treino de resistência, todos têm impacto positivo — diz Stubbs, autor de mais de 300 estudos sobre exercício e saúde mental e do livro “Exercise-Based Interventions for Mental Illness — Physical Activity as Part of Clinical Treatment” (Intervenções baseadas em exercício para doenças mentais — atividade física como parte do tratamento clínico, em tradução livre. Ed. Elsevier).
Segundo Stubbs, o que mais surpreendeu os pesquisadores foi curto tempo necessário para pessoas perceberem melhora em dez métricas emocionais e cognitivas, como confiança, positividade, calma e foco. A maioria dos participantes, bem como os próprios pesquisadores, imaginava que seriam necessários ao menos 30 minutos.
Períodos mais longos e frequentes aumentam o bem-estar mental. Mas a atividade física tem efeito tão poderoso, que mesmo períodos curtos já deflagram mecanismos neuroquímicos, explica Stubbs.
A atividade física estimula, pelo menos, duas áreas do cérebro. A primeira é o hipocampo, associado à memória, ao aprendizado e às emoções. A segunda é o córtex pré-frontal, relacionado à memória e à cognição.
A prática de exercício leva à liberação endocanabinoides, como a anandamida, que tem efeitos analgésicos, ansiolíticos e antidepressivos, semelhantes aos do THC da maconha.
Também faz o cérebro liberar mais dopamina (associada ao prazer e ao humor), serotonina (regulação do sono, do ritmo cardíaco, do apetite, do humor, da memória e da temperatura), noradrenalina (ligada a humor, sono, ansiedade e apetite), além do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, na sigla em inglês). Este último uma espécie de fertilizante cerebral, importante para a formação de neurônios e conexões nervosas.
A atividade física também atua sobre o sistema imunológico e reduz a inflamação, condição de base para uma série de distúrbios. Stubbs acrescenta fatores psicossociais, como aumento da autoconfiança e da autoeficiência.
Estudioso do impacto da atividade física sobre a saúde mental, o psiquiatra Paulo Mattos, professor do Programa de Doutorado do Instituto D’Or de Pesquisa e Educação (Idor), destaca que, embora a duração da atividade física seja relevante, é preciso também considerar a frequência e a intensidade. Dessas três variáveis, Mattos diz que a frequência é a mais importante.
— É preciso se movimentar, sempre. Seja caminhada, corrida, academia, natação, ciclismo, dança, qualquer uma, o importante é se manter ativo, na medida do possível — explica.
Mattos salienta que é preciso não apenas exaltar a necessidade de se manter ativo, mas também de informar à população sobre os malefícios do sedentarismo.
— O sedentarismo está associado a distúrbios mentais. Pessoas que não são ativas bebem mais e têm mais problemas mentais — enfatiza Mattos.
Cientistas dizem que não existe atividade física melhor que outra. A melhor é aquela que se gosta e se pode fazer, observa Paulo Mattos.
— Uma coisa é o ideal. A outra é o possível. O importante é se manter ativo — frisa Mattos.
Stubbs tem convicção semelhante:
— O movimento pode tomar várias formas e todas oferecem benefícios para a saúde física e mental.
Outra surpresa do estudo foi a revelação de que as pessoas mais velhas são mais ativas do que as jovens. O mesmo estudo mostrou que pessoas com mais de 57 anos fazem mais atividade física do que a chamada Geração Z (18 anos a 24 anos). Para os cientistas, a população madura está mais informada e preocupada sobre os efeitos da inatividade. Os jovens se sentem menos vulneráveis. Mas os pesquisadores alertam que os danos do sedentarismo afetam a todos, até mesmo crianças.
— Mente e corpo são incrivelmente complexos e talhados para o movimento. A atividade física estimula sistemas neurobiológicos, imunológicos e psicológicos. Faz o que nenhum remédio é capaz de chegar perto. A tendência é que os exercícios tomem cada vez mais o lugar de medicamentos nas prescrições dos médicos — diz Stubbs.