Novo teste de câncer de ovário pode detectar a doença precocemente


Pesquisadores chineses identificaram moléculas no fluido uterino que auxiliam no diagnóstico; câncer de ovário é oitavo mais incidente nas mulheres.

Por Gabriela Malta, da Agência Einstein

Pesquisadores da Universidade de Pequim, na China, identificaram sete moléculas encontradas no fluido uterino de mulheres com câncer de ovário. Essa descoberta pode auxiliar no diagnóstico precoce da doença. Segundo especialistas, o teste ainda está em estágio preliminar e não possui aplicação clínica, no entanto, apresentou resultados promissores.

O câncer de ovário é o oitavo câncer mais incidente em mulheres. Estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) apontam 7.310 novos casos por ano no Brasil. Esse tipo de tumor também é o mais mortal, com uma taxa de sobrevida em cinco anos variando de 35% a 40%, justamente porque a doença é frequentemente descoberta em estágio avançado.

O teste desenvolvido pelos pesquisadores chineses consiste em procurar por proteínas alteradas que são produzidas pelos genes BRCA1 e BRCA2, que estão na tuba uterina e estão relacionadas a esse tipo de tumor.

Para desenvolver o teste, os pesquisadores chineses coletaram fluido uterino de 219 mulheres com câncer, incluindo aquelas com câncer de ovário em estágio inicial, câncer de ovário em estágio avançado, tumores benignos de ovário e câncer de endométrio. Esse fluido uterino contém células e produtos metabólitos, ou seja, moléculas, provenientes dos ovários e das tubas uterinas.

Os pesquisadores examinaram o fluido uterino de 96 mulheres para procurar quais metabólitos estavam em níveis distintos naquelas com câncer de ovário em estágio inicial. Eles identificaram um grupo de sete metabólitos, incluindo os aminoácidos tirosina e fenilalanina, que poderiam ser usados para o diagnóstico.

Em seguida, eles testaram os fluidos das 123 mulheres restantes para esses sete metabólitos e realizaram o teste de marcador tumoral CA125 nelas. O novo teste identificou com precisão a maioria das pessoas com câncer de ovário em estágio inicial e teve um desempenho muito melhor do que o teste CA125 no diagnóstico de câncer de ovário em estágio inicial.

“São dados preliminares, não se trata de um estudo clínico definitivo, mas gera uma hipótese promissora”, diz a médica oncologista e membro do Comitê de Tumores Ginecológicos da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), Angélica Nogueira Rodrigues.

O secretário da Comissão Especializada em Ginecologia Oncológica da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), Jesus Paula Carvalho, diz que o estudo mostrou que o caminho escolhido pelos pesquisadores é um caminho viável. “Mas, ainda é preciso saber se é viável aplicar esse método na população geral. Há a dificuldade logística de coletar fluido uterino das mulheres, quando o câncer está se desenvolvendo, e analisar esse fluido no laboratório”, afirma Carvalho, que é especializado em ginecologia oncológica.

Diagnóstico difícil

Segundo o ginecologista, a redução de mortes por câncer de ovário é um grande desafio para a medicina. Inovações tecnológicas que poderiam permitir detecção precoce da doença, como exames de ultrassom que surgiram na década de 1970, ou a descoberta de marcadores tumorais (substâncias encontradas no sangue que indicam presença de tumores), ou até mesmo estratégias de detecção que combinavam os dois métodos não impactaram na redução do número de mortes por câncer de ovário na população geral. 

“Até que na virada do milênio, a comunidade médica e cientistas começaram a se perguntar: se a gente procura o câncer de ovário no ovário de todas as formas possíveis e só o encontramos em estado avançado, tem alguma coisa errada. Foi nessa época também que descobrimos que mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 estão relacionadas a tumores no ovário”, conta Carvalho.

O médico explica que até 50% das mulheres que têm mutações nesses genes irão desenvolver a doença. “Nós podemos identificar essas mulheres. Geralmente, há histórico de casos na família e, então, fazemos o teste genético. Havendo mutação deletéria, a recomendação é a retirada precoce (a partir dos 35 anos de idade) dos ovários e das tubas uterinas”, diz. 

A análise dos ovários e tubas uterinas dessas mulheres demonstrou tumores microscópicos nas tubas uterinas. “Percebeu-se que o câncer de ovário começa, na verdade, nas fímbrias, que é a parte da ponta das tubas uterinas. Quando a mulher ovula, forma-se uma espécie de ferida no ovário e a tuba, ao captar o óvulo, deixa ali no ovário algumas de suas células. São elas que causam o câncer e isso mudou totalmente a maneira de interpretar o câncer ovário”, explica. 

Mas como encontrar uma lesão microscópica em um órgão tão delicado quanto as tubas uterinas, que se encontram no interior da pelve? 

“Tivemos que pensar em outras estratégias. Começamos a pensar: por que não tentamos achar a célula que está descamando lá na tuba e descendo pelo útero, colo do útero e chega na vagina e ver se ela é maligna ou não? Isso foi uma ideia, só que são poucas as células que estão descamando lá na tuba e é uma mera sorte você conseguir encontrá-la na vagina. O papanicolau, por exemplo, não consegue detectar câncer de ovário porque a célula que chega na vagina já se rompeu, então não dá. Mas, se não dá pra ver a célula, talvez a gente possa ver o DNA da célula”, diz.

Em 2013, Carvalho participou de um estudo com demais pesquisadores da USP [Universidade de São Paulo] e da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, em que coletava o material na vagina e procurava por DNA alterado, que foi chamado de papanicolau do ovário. “O estudo provou que é possível identificar as mulheres com câncer através de um painel de 22 genes alterados, mas que não é prático. Procurar por genes em células que saem na vagina é um processo muito complexo e caro”, continua.

Sintomático 

O câncer de ovário, na fase inicial, não causa sintomas específicos e, como ainda não há uma estratégia eficaz de rastreamento precoce da doença na população geral, a doença geralmente é diagnosticada tardiamente, quando já está em estágio avançado.

À medida que o tumor cresce, pode causar pressão, dor ou inchaço no abdômen, pelve, costas ou pernas, náusea, indigestão, gases, prisão de ventre, diarreia, falta de apetite, desejo de urinar com mais frequência, cansaço constante ou massa palpável no abdome. 

“Os sintomas que costumam levar as pacientes ao consultório são inchaço na barriga, sensação de plenitude ao se alimentar e alterações dos hábitos do intestino ou da urina. Então, são sintomas muito inespecíficos”, diz a médica oncologista da SBOC.

Diante da suspeita do câncer de ovário, o médico poderá pedir exame de sangue específico para identificação do marcador tumoral chamado CA125 e ultrassonografia transvaginal. Baseados nos resultados destes testes, poderá ser indicada biópsia do tecido ovariano.

Diversas modalidades de tratamento são oferecidas a pacientes com câncer de ovário: cirurgia, radioterapia e quimioterapia. Normalmente o tratamento do câncer do ovário é multimodal, ou seja, combina as diversas modalidades de tratamento.

A cirurgia que retira útero, tubas uterinas e ovários é indicada para mulheres que têm alto risco confirmado de ter a doença, é denominada cirurgia redutora de risco.

Fatores de risco 

Segundo o INCA, fatores de que aumentam o risco de desenvolver câncer de ovário são:

Idade – A incidência de carcinoma de ovário aumenta com o avanço da idade.
Fatores reprodutivos e hormonais – O risco de câncer de ovário é aumentado em mulheres com infertilidade e reduzido naquelas que tomam contraceptivos orais (pílula anticoncepcional) ou que tiveram vários filhos. Por outro lado, mulheres que nunca tiveram filhos parecem ter risco aumentado para câncer de ovário. A incidência de câncer de ovário é maior nas mulheres que mais ovulam.
Atividade hormonal – A menarca (primeira menstruação) precoce, ou seja, antes dos 12 anos, e a idade tardia na menopausa, após os 52 anos, podem estar associadas a risco aumentado de câncer de ovário.
A infertilidade é fator de risco para o câncer de ovário, mas a indução da ovulação para o tratamento da infertilidade não parece aumentar o risco de desenvolver a doença.
O risco de câncer de ovário com terapia hormonal pós-menopausa aparenta ser pequeno.
História familiar – Histórico familiar de cânceres de ovário, colorretal e de mama está associado a risco aumentado de câncer de ovário.
Fatores genéticos – Mutações em genes, como BRCA1 e BRCA2, estão relacionadas a risco elevado de câncer de mama e de ovário. Existem pelo menos outros 12 genes implicados com aumento na incidência de câncer de ovário, em menor monta.
Excesso de gordura corporal – Aumenta o risco de desenvolvimento de câncer de ovário.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *