Embora a bebida não seja a única responsável, estudo demonstra que sua contribuição é significativa; quem opta em ingerir álcool deve consumir de forma moderada.
Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Uma análise de sete estudos abrangendo mais de 19 mil indivíduos saudáveis e sem histórico de hipertensão revelou que os níveis de pressão arterial aumentam mais rapidamente em adultos que consomem álcool dentro de sua rotina. A pesquisa apontou uma ligação entre o aumento da pressão arterial sistólica (explicada a seguir) e a quantidade de bebida alcoólica ingerida, inclusive entre aqueles com um baixo consumo diário, quando comparados com os não consumidores.
A pressão arterial sistólica é aquela medida durante a contração do coração (força exercida contra as paredes das artérias), geralmente mais alta. A pressão diastólica é medida durante o relaxamento do coração, por isso é geralmente mais baixa. À medida que as pessoas envelhecem, a pressão sistólica tende a aumentar e, por isso, ela é um importante preditor de risco para doença cardiovascular – e o seu controle é fundamental para prevenir ou retardar o desenvolvimento da hipertensão.
“Ambas as medidas são importantes [sistólica e diastólica]. O coração realiza ciclos de contração-relaxamento o tempo todo, e a pressão oscila de uma [sistólica] para outra [diastólica]. Por isso, não avaliamos a pressão de forma dissociada: ambas podem comprometer a saúde cardiovascular”, explicou o cardiologista Humberto Graner, coordenador do Pronto-Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein de Goiânia.
A revisão dos sete estudos envolveu análise de dados de 19.548 adultos (65% eram homens) entre 20 e 70 anos que moravam nos Estados Unidos, Coréia e Japão. Nenhum deles tinha diagnóstico prévio de hipertensão, diabetes, doença hepática ou alcoolismo.
No início do estudo, os pesquisadores registraram a ingestão habitual de álcool, que foi convertida em gramas e não em número de bebidas para evitar possíveis variações na quantidade de álcool presente nas bebidas consideradas padrão nos diferentes países.
Para fins de comparação, os pesquisadores utilizaram dados referentes à quantidade de álcool presente em diferentes tipos de bebidas nos Estados Unidos (oz): 12 ozde cerveja (equivalente a cerca de 350 ml), cinco oz de vinho (aproximadamente 148 ml) ou uma dose de 1,5 ozde destilados (cerca de 44 ml). Essas quantidades correspondem a aproximadamente 14 mg de álcool.
Os resultados do estudo, publicados na Hypertension, apontam que entre aqueles que consumiam uma média de 12 mg de álcool por dia, a pressão arterial sistólica (número superior) aumentou 1,25 mmHg ao longo dos anos e a diastólica (número inferior) 1,14 mmHg. Já entre os que bebiam uma média de 48 gramas de álcool por dia, a pressão sistólica aumentou 4,9 mmHg e a diastólica aumentou 3,1 mmHg.
Segundo os pesquisadores, essa é a primeira vez que uma análise confirma o aumento contínuo das medidas da pressão arterial em pessoas com baixo e alto consumo de álcool – que é um fator de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Mesmo naqueles indivíduos que tinham um consumo baixo de álcool foi observado aumento dos níveis pressóricos ao longo do tempo, embora essa alteração tenha sido menor do que o aumento da pressão observado em pessoas que consumiam mais quantidade de álcool todos os dias.
“Estes dados mostram que o consumo de álcool pode ser abordado como um fator modificável na prevenção da hipertensão. Embora esse aumento de quase 5 mmHg na pressão arterial possa parecer pouco, essa elevação pode comprometer a saúde do coração ao longo de 10 ou 15 anos. Importante notar que a associação foi linear: quanto maior o consumo de álcool, maior o impacto negativo no aumento da pressão arterial”, avaliou Graner.
Segundo o cardiologista, o consumo de álcool pode levar ao aumento temporário da pressão arterial, e o consumo crônico e excessivo está associado a uma elevação sustentada da pressão arterial, mas a ciência ainda não sabe qual o mecanismo exato que leva ao problema. “Acredita-se que pode envolver a alteração dos níveis de hormônios que regulam a pressão arterial e o enrijecimento dos vasos sanguíneos”, explicou.
Consumo moderado
Apesar dos resultados, não é possível afirmar que o álcool sozinho seja o responsável pelo aumento dos níveis de pressão. “Não é possível atribuir esse aumento da pressão diretamente e somente ao álcool, mas sim, ao hábito de ingerir bebidas alcoólicas. O que sabemos é que nem sempre aquele que consome álcool o faz sozinho. O ‘tira-gosto’, por exemplo, que muitas vezes acompanha a bebida alcoólica, é rico em sódio, gordura e calorias, e pode também contribuir com este aumento”, ponderou.
Segundo Graner, dentro da cardiologia a moderação é a chave. “Algumas diretrizes sugerem que, se as pessoas optarem por consumir álcool, devem fazê-lo com moderação. Para aqueles que não bebem, não recomendamos que iniciem este hábito”, reforçou o médico que ressalta que o estudo comprova que mesmo o consumo de baixas quantidades de álcool pode influenciar a pressão arterial ao longo do tempo.
“Isso reforça a importância de avaliarmos o consumo de álcool durante o atendimento clínico não só da perspectiva binária de “bebe ou não bebe”, mas do hábito e estimativas da quantidade de álcool ingerido”, finalizou.