Cerca de 50 milhões de pessoas vivem com epilepsia globalmente, segundo a OMS. A condição é caracterizada por convulsões causadas por uma atividade atípica dos impulsos elétricos no cérebro, sendo a eletroestimulação medular uma das possíveis alternativas para o controle desses sintomas. Pensando nisso, pesquisadores do Instituto Santos Dumont (ISD), localizado em Macaíba, no Rio Grande do Norte, desenvolveram uma interface cérebro-máquina capaz de detectar automaticamente o período da crise a partir de sinais neurais, ativando a eletroestimulação na medula espinal no momento da crise.
A tecnologia é descrita como uma interface cérebro-máquina, ou seja, estabelece um caminho direto entre o cérebro e um dispositivo externo, aliada à estimulação elétrica da medula espinal. O objetivo é detectar crises epilépticas em um “momento ideal” para que a estimulação medular atenue, ou até mesmo anule, as convulsões.
Quem assina o estudo como autora principal é Erika Garcia Cerqueira, engenheira biomédica de formação e neuroengenheira formada pelo Programa de Pós-graduação em Neuroengenharia do ISD. A pesquisa fez parte de seu trabalho de mestrado na instituição, em 2022.
Hoje doutoranda na Espanha, a cientista explica que a ideia do trabalho veio a partir de uma observação da associação entre a epilepsia e o excesso de conectividade cerebral.
“Ao me aprofundar na área de neuroengenharia no ISD, percebi o quão prevalente é a epilepsia, tanto na sociedade brasileira quanto no contexto global. Apesar de já ter amigos e conhecidos que convivem com a condição, foi ao analisar os dados que compreendi a magnitude do impacto que a epilepsia tem na sociedade”, considera.
A interface teria, em uma versão futura, o potencial de transformar a qualidade de vida dos pacientes, pois sua configuração e resultados esperados permitiriam superar barreiras ligadas aos impactos das crises que impedem a vivência plena do paciente. “Com um maior número de participantes e depois de fases de validação suficientes, seria extremamente relevante que essa interface pudesse ser utilizada na prática, com pessoas com epilepsia”, complementa Erika.
Além de Erika, fazem parte do estudo Raquel Medeiros e Mariane de Araújo e Silva, também neuroengenheiras formadas pelo ISD; Fernando da Silva Fiorin, Ramón Hypolito Lima, André Felipe Oliveira de Azevedo Dantas, Abner Cardoso Rodrigues e Denis Delisle-Rodriguez. Ramón, André e Denis são professores e Fernando é pesquisador de pós-doutorado no Instituto.
Intitulado “Interface cérebro-máquina baseada em potencial de campo local para inibir crises epilépticas utilizando estimulação elétrica da medula espinal” (em tradução livre), um artigo que expõe as descobertas foi publicado na “Biomedical Physics & Engineering Express”, da IOP Science, publicação mantida pelo Instituto de Física do Reino Unido.
O ISD e a epilepsia
Além de fomentar pesquisas que têm como tema de estudo a epilepsia, o ISD é referência no acolhimento de pessoas com epilepsia farmacorresistente, ou seja, casos em que os medicamentos não estão controlando as convulsões.
O Centro Especializado em Reabilitação da instituição (CER ISD) possui uma linha de cuidado específica para a epilepsia, que recebe pessoas de todas as idades e contempla todo o estado do Rio Grande do Norte.