Trio de cientistas foi laureado por identificar como o sistema imune é mantido sob controle para não atacar células saudáveis do corpo

Ilustração das células T reguladoras. — Foto: The Nobel Committee for Physiology or Medicine / Mattias Karlén
Um trio de cientistas foi anunciado, nesta segunda-feira, como os laureados do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina 2025 por suas descobertas em relação a como o sistema imunológico é mantido sob controle para que ele não prejudique o corpo humano.
Entre as repercussões desse achado, o Comitê do prêmio destacou um novo caminho de tratamentos para câncer e doenças autoimunes e para obter melhores resultados com transplantes de órgãos, com mais de 200 estudos clínicos envolvendo o mecanismo já em andamento.
Os cientistas identificaram os “guardas de segurança” do sistema imunológico, células T de defesa específicas, que receberam posteriormente o nome de reguladoras, que impedem que outras células imunológicas ataquem o próprio corpo.
As descobertas deles foram decisivas para o nosso entendimento de como o sistema imunológico funciona e por que nem todos nós desenvolvemos doenças autoimunes graves”, afirma Olle Kämpe, presidente do Comitê Nobel, em comunicado.
Todos os dias, as células que compõem o sistema imune, como os linfócitos e os anticorpos, protegem o corpo de milhares de microrganismos que tentam invadi-lo. Mas muitos desses agentes evoluíram para possuir características que os assemelham às células saudáveis do organismo, como uma espécie de camuflagem.
Por isso, os cientistas se perguntavam de que maneira o sistema imunológico consegue diferenciar adequadamente os invasores das células do próprio corpo, de forma a não atacar partes do organismo. Quando essa distinção não funciona como deveria, por exemplo, ocorrem as chamadas doenças autoimunes, caso do diabetes tipo 1 e do lúpus.
Nos anos 80, cientistas descobriram que as células T, ao serem produzidas, passam por um processo de amadurecimento no timo, uma glândula do sistema imunológico localizada no tórax. Nesse momento, aquelas com defeitos, como as que encaram partes saudáveis do corpo como invasoras, são eliminadas. Esse mecanismo foi chamado de tolerância imune central.
Porém, com experimentos em camundongos sem timo, Shimon Sakaguchi, da Universidade de Osaka, no Japão, observou que havia outras células que também protegiam os animais de desenvolver doenças autoimunes. Nesse momento, ele imaginou que deveria haver uma espécie de outra “guarda de segurança” no corpo para controlar a resposta imunológica.
A partir daí, cientistas de todo o mundo têm buscado utilizar esses achados no desenvolvimento de novos tratamentos com a esperança de tratar ou curar doenças autoimunes, fornecer terapias mais eficazes para o câncer e prevenir complicações graves após transplantes de células-tronco. O trio vai dividir o prêmio de 11 milhões de coroas suecas, o equivalente a cerca de R$ 6,24 milhões na cotação atual.
Como a descoberta pode revolucionar o tratamento do câncer?
No caso dos tumores, um dos objetivos é aprimorar as imunoterapias, nova linha de terapias oncológicas que recebeu o Nobel de Medicina em 2018. Ela parte do entendimento de que células cancerígenas desenvolvem a capacidade de “se esconder” do sistema imune, e por isso não são eliminadas naturalmente pelo corpo.
Tratamentos já existentes conseguem atuar em alguns desses mecanismos de camuflagem, estimulando as defesas do organismo a reconhecerem o tumor e eliminá-lo. Mas a imunoterapia ainda é restrita a poucos tipos de câncer e determinados pacientes. Nesse sentido, as células T reguladoras surgem como uma nova frente dessa batalha.
“O mapeamento de tumores mostra que eles podem atrair um grande número de células T reguladoras que os protegem do sistema imunológico. Por isso, os pesquisadores tentam encontrar formas de derrubar essa barreira de células T reguladoras, permitindo que o sistema imunológico acesse os tumores”, explica o Comitê do Nobel, em comunicado.
Cientistas já desenvolveram anticorpos monoclonais projetados para atingir e eliminar as células T reguladoras associadas a tumores, e ensaios clínicos (testes com humanos necessários para a aprovação de um novo tratamento) estão em andamento.