ONU mobiliza pesquisadores na busca de soluções para a crise socioeconômica decorrente da COVID-19


Claudia Izique | Agência FAPESP –A Organização das Nações Unidas (ONU) mobilizou 250 pesquisadores, dirigentes de agências de fomento de 25 países – a FAPESP, entre elas –, formuladores de políticas governamentais, entre outros, para, juntos, definir estratégias nacionais e internacionais de recuperação da crise socioeconômica que se espalhou pelo planeta na esteira da pandemia da COVID-19.

Ao longo de dez semanas, estes 250 especialistas elaboraram um roteiro com 25 prioridades de pesquisas, detalhadamente descrito no United Nations Research Roadmap for the COVID-19 Recovery e divulgado hoje. “Esse roteiro é uma ferramenta que pode ser utilizada por pesquisadores, agências de fomento à pesquisa, organizações da sociedade civil, governos e instituições internacionais para construir parcerias, alinhar esforços de pesquisa e demonstrar o poder da ciência global”, afirma Amina Mohammed, vice-secretária-geral da ONU na mensagem de abertura do documento.

Documento propõe 25 prioridades de pesquisa em áreas estratégicas para a construção de um futuro mais justo, resiliente e sustentável (foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Os 25 temas de pesquisa estão distribuídos em cinco áreas consideradas prioritárias para a construção de um futuro mais justo, resiliente e sustentável, alinhados aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS): proteção de serviços e sistemas de saúde; garantia de proteção social e serviços básicos; planejamento da retomada de empregos, de pequenas e médias empresas e de oportunidades para trabalhadores do setor informal; apoio à resposta macroeconômica e à colaboração multilateral; e fortalecimento da coesão social e da resiliência da comunidade.

A ciência, na visão da ONU, é a “melhor chance” para o planeta se recuperar da COVID-19, já que é capaz de produzir mudanças transformadoras, que envolvem engenhosidade, pesquisa em todas as áreas do conhecimento, parcerias e colaboração. As cinco estratégias e 25 prioridades de pesquisa propostas no documento têm como objetivo mobilizar a comunidade científica para este desafio.

A contribuição da FAPESP

Em cinco capítulos e mais de 120 páginas, o documento, coordenado por Steven Hoffman, diretor científico do Canadian Institutes of Health Research, do Canadá, aponta um conjunto de recomendações e oferece uma lista de temas de pesquisa – no formato de perguntas – para cada um dos cinco pilares estratégicos. Adicionalmente, em cada pilar, são identificadas três subprioridades de pesquisas de impacto imediato (quick-win), de maior retorno sobre o investimento (best-buy) e de grande poder de transformação (game-changer).

No pilar Proteção Social e Serviços Básicos, por exemplo, as recomendações têm foco em políticas em favor das populações mais pobres, nos serviços essenciais de alimentação, nutrição – especialmente de crianças e mulheres – e saneamento, na aprendizagem sustentada, em serviços sociais e na implementação de medidas contra a violência de gênero.

Neste pilar, pesquisas que busquem definir estratégias de fornecimento de serviços básicos para proteger a saúde mental de trabalhadores são classificadas como quick-win, iniciativas para a inclusão digital são apontadas como best-buy e medidas eficazes para a proteção da renda básica são os game-changer. Essas sugestões são seguidas de cinco recomendações de pesquisas envolvendo medidas de proteção social inclusivas, redução da desigualdade, prosperidade, entre outras.

A FAPESP, representada pelo seu diretor científico, Luiz Eugênio Mello, e pela pesquisadora Marta Arretche, ex-coordenadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da Fundação –, contribuiu para a identificação das perguntas-chave do pilar Proteção Social e Serviços Básicos, ao lado de representantes de outras dez instituições de pesquisa de todo o mundo.

“O grande desafio foi traduzir as questões relevantes para implementação imediata e que, ao mesmo tempo, ofereçam um desafio de pesquisa a ser trabalhado. Evidentemente há muito conhecimento já disponível, mas que, por vezes, carece de ajustes locais para ser adequadamente aplicado em benefício da sociedade”, afirma Mello.

A FAPESP teve uma participação importante na inclusão de dois temas relevantes, sublinha Arretche. “O primeiro diz respeito à importância da inclusão digital. Este é um grande desafio contemporâneo e a pesquisa ainda tem um espaço muito grande de contribuição. O segundo diz respeito à importância de estudos sobre implementação, etapa crucial da produção de políticas e estudos que, neste campo, podem apresentar resultados muito relevantes para nosso conhecimento sobre as estratégias de inclusão social.”

Coordenado por Angela Liberatore, do European Research Council, e por Bhushan Patwardhan, do Indian Council of Social Science Research, o grupo que elaborou propostas para o pilar Proteção Social e Serviços Básicos também contou com a participação de Anita Charlesworth, do Health Foundation, do Reino Unidos; Isayvani Naicker, da African Academy of Sciences, do Quênia; e Sara Wolfe, do Grand Challenges Canada, do Canadá.

“Não deixar ninguém para trás”

O documento United Nations Research Roadmap for the COVID-19 Recovery  parte do pressuposto da interdependência de todos os habitantes do planeta para dar suporte aos seus três eixos principais – equidade, resiliência e sustentabilidade – e à proposta de construção de uma base sólida de conhecimento a ser apresentada como opção aos governos, sociedade civil e setor privado com o objetivo de “não deixar ninguém para trás”. E o fator impulsionador de uma recuperação econômica equitativa é a pesquisa.

“Fortalecer a capacidade de pesquisa nacional é crítico para garantir que os pesquisadores locais possam gerar conhecimento adequado à tomada de decisões”, afirma o documento. Para tanto, também a empreitada de pesquisa deve ser mais equitativa, diversa, inclusiva e participativa.

A ONU recomenda que as agências de fomento “trabalhem juntas” para garantir recursos para o financiamento das prioridades de pesquisa que buscam solução para a crise socioeconômica engendrada pela COVID-19, por meio do fortalecimento de parcerias em âmbito nacional e internacional. “A colaboração é vital para a implementação desse roteiro”, destaca o documento.

Com base nesse documento a FAPESP dará início às discussões para o lançamento de chamadas específicas endereçando as prioridades definidas nesse mapa. “O protagonismo da FAPESP ao participar dessa iniciativa das Organização das Nações Unidas dá ao pesquisador do Estado de São Paulo a possibilidade de inserção em chamadas internacionais na investigação de um tópico cujas soluções e desafios também tenham uma natureza global”, diz Mello.

A íntegra do documento está disponível em https://www.un.org/en/pdfs/UNCOVID19ResearchRoadmap.pdf.

 

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