Dois meses, três estados: como país confirmou primeira reinfecção por covid


No dia 10 de outubro, durante um plantão no Hospital Universitário da UFPB (Universidade Federal da Paraíba), uma médica sentiu-se mal e teve uma amostra coletada para investigar se estaria com covid-19. Não era um caso qualquer: quatro meses antes ela teve a doença diagnosticada, o que levantou a suspeita de reinfecção do novo coronavírus.

“Quando ela sentiu sintomas no plantão aqui no hospital do lado, a equipe de vigilância epidemiológica do hospital atuou logo. Ela passou por avaliação e teve coleta de material, que veio para o nosso laboratório. Essa comunicação rápida aqui e depois com a secretaria de estado foi fundamental”, relata João Felipe Bezerra, coordenador do do Laboratório de Vigilância Molecular Aplicada da UFPB.

Ontem (10), dois meses após ela passar mal, o Ministério da Saúde confirmou que o caso da médica que mora em Natal e tem 37 anos —e que não teve o nome revelado— é o primeiro confirmado de reinfecção, com linhagens diferentes, do novo coronavírus.

Mas até chegar ao resultado final apontado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), houve um longo trabalho de cooperação entre grupos, com pesquisadores em uma ação que teve participação de pelo menos cinco órgãos de saúde em três estados. Só na Fiocruz a equipe é composta por 43 pessoas.

Três dias depois de a médica colher o sangue, o resultado dela deu positivo. O exame foi feito no laboratório da UFPB, que informou então ao governo do estado.

“A gente trouxe as amostras para o laboratório porque a gente avalia e monitora, junto com o Lacen [Laboratório Central], esses possíveis casos de reinfecção. Foi muito importante para esse caso ter atuado rápido, fazendo a coleta de imediato. Com o teste dando positivo, fizemos contato com a Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Saúde da Paraíba, que deu encaminhamento ao caso”, conta João.

Análises complementares

Mas confirmar um caso de reinfecção não é algo simples, e o roteiro é repleto de dados necessários. Inicialmente, para triar o caso, o diretor do laboratório da UFPB conta que um detalhe chamou a atenção e o fez suspeitar mais fortemente de reinfecção: a alta carga viral da paciente.

“Ela, na verdade, teve dois casos leves, mas nesse segundo tinha uma carga viral alta. São muitos casos suspeitos, só na Paraíba temos 10, mas só dois até aqui têm características de carga viral alta, que apontam para reinfecção. Os outros podem ser o vírus da primeira vez ainda no corpo, por exemplo”, explica.

Após juntar as informações, o sangue colhido da médica foi mandado para a bióloga e pesquisadora Paola Resende, da Fiocruz no Rio de Janeiro, junto com a amostra do mesmo laboratório feita em 23 de junho, que também deu positiva para o novo coronavírus.

Com as amostras em mãos, Paola iniciou o sequenciamento genético do Sars-CoV-2 para identificar suas linhagens. O resultado mostrou que sim, eram diferentes —o que só poderia ocorrer por uma nova infecção.

Para critério científico mais robusto era importante ter uma amostra negativa feita no intervalo desses dois resultados. Essa informação veio do Lacen do Rio Grande do Norte, que analisou coleta de sangue da paciente em setembro.

“Temos vários casos em investigação registrados no país, mas às vezes é muito difícil parear os dados da primeira com a segunda amostra. Por isso a dificuldade em chegar nessa confirmação. O trabalho feito na Paraíba foi fundamental para chegarmos a essa conclusão agora”, diz.

Entre os critérios definidos pela OMS (Organização Mundial de Saúde) estão: ter mais de 90 dias entre um episódio e outro; sintomatologia relacionada; e RT-PCR confirmado por mais de um laboratório. “Somente com esses critérios se confirma a reinfecção”, pontua.

Agora, novas amostras da médica devem ser analisadas para saber detalhes como se ela criou algum tipo de imunidade ou não após ter a primeira infecção. “Vamos avaliá-la também ao longo do tempo para entender como vai ser a resposta do organismo para nos ajudar nesse processo”, completa.

 

UOL

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