Pesquisadores da Unicamp analisaram o papel dos ácidos graxos no controle da doença
Mariana Nakajuni, da Agência Einstein
Consumir fibras pode diminuir o impacto da Covid-19 no organismo. É o que revela um estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em que pesquisadores brasileiros constataram que compostos produzidos no intestino a partir da fermentação de fibras alimentares ajudaram a reduzir inflamações em pacientes com a doença.
Para a elaboração da pesquisa, cujos resultados foram publicados na revista Gut Microbes, os pesquisadores colheram amostras de tecido do cólon de 11 pacientes saudáveis. Nenhum deles havia contraído a Covid-19 nem possuía alterações no intestino. Foram coletadas também células epiteliais, que revestem internamente o órgão. Em seguida, as amostras foram infectadas com o vírus SARS-CoV-2 e divididas em dois grandes grupos: um de controle e outro que foi tratado com uma mistura de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC).
Os AGCC atuam no metabolismo e na regulação da resposta imune quando o organismo é acometido por infecções. Essas substâncias são produzidas a partir da ação de bactérias presentes na flora intestinal, que realizam a fermentação das fibras, um tipo de carboidrato encontrado em alimentos como frutas, vegetais, leguminosas e grãos integrais. Estudos recentes demonstraram que pacientes afetados pela Covid-19 apresentam uma diminuição nas bactérias que produzem os AGCC. Além disso, o vírus é capaz de entrar nas células intestinais e alterar suas funções, levando a sintomas como vômito, diarreia e dores abdominais.
“Tínhamos a hipótese de que uma redução na produção dos ácidos graxos de cadeia curta afetaria a entrada do SARS-CoV-2 e a resposta das células intestinais”, diz o estudo. Diferentemente do que foi inicialmente proposto, os cientistas descobriram que a presença dos AGCC não interfere na infecção e replicação do vírus no órgão. Porém, as amostras tratadas com a mistura apresentaram uma menor expressão de interferon-beta (IFN-beta), uma molécula envolvida no processo chamado de “tempestade de citocinas”, reação imune do organismo que leva a quadros inflamatórios nos casos mais graves de Covid-19.
Além disso, houve uma diminuição do gene DDX58, um receptor que reconhece células infectadas pelo vírus e desencadeia respostas que estimulam a inflamação. Os pesquisadores também notaram uma menor presença da proteína TMPRSS2, que facilita a entrada do SARS-CoV-2 nas células. No entanto, o estudo sugere que, neste caso, a atenuação da proteína não é suficiente para gerar um efeito significativo e evitar a infecção, já que a quantidade de vírus nas amostras tratadas e não tratadas era a mesma.
Ainda que os resultados tenham se desviado da hipótese inicial, os cientistas afirmam que “essas descobertas não excluem a possibilidade de que os ácidos graxos de cadeia curta possuam um impacto significativo na infecção por SARS-CoV-2”. Segundo eles, os efeitos da resposta ao vírus pela flora intestinal podem depender das interações com outros tipos de células, o que requer novos estudos para compreender os mecanismos por trás da infecção.
O estudo faz a ressalva de que o pequeno número de participantes e a falta de amostras de pacientes infectados pelo novo coronavírus podem trazer limitações aos resultados. Por outro lado, reconhecem que “o uso de amostras humanas, mesmo que de pacientes não infectados, fornece uma contribuição relevante para estabelecer o potencial papel dos AGCC nessa doença pandêmica”.
(Fonte: Agência Einstein)