Doença de Alzheimer aumenta riscos de gravidade e morte por COVID-19


Elton Alisson | Agência FAPESP – As doenças neurodegenerativas que causam demência aumentam os riscos de gravidade e morte por COVID-19. No caso de pacientes com doença de Alzheimer, esses riscos são três vezes maiores e podem ser aumentados em seis vezes se tiverem mais de 80 anos.

As constatações foram feitas por meio de um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Butantan, em parceria com colegas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Pacientes com essa condição neurodegenerativa têm três vezes mais chance de falecer em decorrência da infecção pelo SARS-CoV-2 e seis vezes mais se tiverem mais de 80 anos, aponta estudo de pesquisadores da USP, Instituto Butantan e UFRJ (imagem: Gerd Altmann/Pixabay)

Os resultados do estudo, apoiado pela FAPESP, foram descritos em artigo publicado nesta quarta-feira (21/04) na revista Alzheimer’s&Dementia: The Journal of the Alzheimer’s Association.

“Verificamos que todas as causas de demência são fatores de risco de aumento da gravidade e de morte por COVID-19 e que, em pacientes com doença de Alzheimer, esses riscos são mais acentuados”, diz à Agência FAPESP Sérgio Verjovski, professor do Instituto de Química da USP e coordenador do projeto.

A demência já tinha sido identificada como um fator de risco para COVID-19 junto com outras comorbidades, como doenças cardiovasculares e respiratórias, hipertensão, diabetes, obesidade e câncer. Um dos motivos é própria a idade: pacientes com demência, em média, são mais velhos e grande parte vive sob cuidados de outras pessoas em casa ou lares de idosos, o que aumenta o risco de infecção e transmissão do vírus.

No entanto, ainda não tinha sido avaliado se pacientes com doenças neurodegenerativas que causam a demência – como a doença de Alzheimer e de Parkinson – são mais infectados, têm maior risco de desenvolver formas graves e morrer em decorrência da COVID-19, e se a idade avançada acentua esses perigos.

A fim de esclarecer essas dúvidas, os pesquisadores investigaram o número de diagnósticos positivos, hospitalizações e mortes por COVID-19 em uma coorte de 12.863 pacientes acima de 65 anos com dados de teste positivo ou negativo para o coronavírus, cadastrados entre março e agosto de 2020 no UK Biobank – banco de dados clínicos de cerca de 500 mil pacientes acompanhados desde 2006 pelo sistema público de saúde do Reino Unido.

Desse total de pacientes, 1.167 foram diagnosticados com COVID-19. Para considerar a idade como um fator de risco, eles foram estratificados em três faixas etárias: de 66 a 74, 75 a 79 e 80 anos ou mais.

“Algumas vantagens de usar os dados clínicos desse banco é que são detalhados, ou seja, registram todas as doenças preexistentes e indicam os pacientes testados positivo ou negativo, hospitalizados e os que vieram a óbito em decorrência da COVID-19. Isso permite avaliar os fatores de risco associados à infecção, gravidade e morte pela doença, incluindo todas as causas de demência, particularmente as doenças de Alzheimer e de Parkinson”, explica Verjovski.

Os resultados das análises estatísticas indicaram que todas as causas de demência – e, particularmente, a doença de Alzheimer – foram fatores de risco para gravidade e morte de pacientes hospitalizados, independentemente da idade.

A doença de Alzheimer, especificamente, não aumentou o risco de hospitalização na comparação com as comorbidades crônicas. Entretanto, uma vez internados, os pacientes com a doença apresentaram risco três vezes maior de desenvolver quadro grave ou morrer em decorrência da COVID-19 em comparação com pacientes que não tinham a doença neurodegenerativa. No caso de pacientes acometidos pela doença e com idade acima de 80 anos, esses riscos foram seis vezes maiores em comparação com pacientes menos idosos, constataram os pesquisadores.

“Há algum fator, ainda não identificado, que aumenta a predisposição de pacientes nessa condição a evoluir para um quadro mais grave e falecer em decorrência da COVID-19”, avalia Verjovski.

“Os resultados do nosso trabalho indicam que é necessário dar uma atenção especial a esses pacientes ao serem internados”, afirma.

Hipóteses diagnósticas

Uma das explicações para os desfechos observados é que condições inflamatórias crônicas ou respostas imunológicas defeituosas, causadas pelo envelhecimento do sistema imunológico (imunossenescência), podem aumentar a vulnerabilidade e reduzir a capacidade desses pacientes de montar respostas eficazes à infecção.

Outra hipótese é a alteração da permeabilidade da barreira hematoencefálica, causada pela doença de Alzheimer, que pode possibilitar o aumento da infecção no sistema nervoso central

Estudos recentes mostraram que o SARS-CoV-2 é capaz de invadir o sistema nervoso central por meio da mucosa olfatória e que a presença do vírus nessa região resulta em uma resposta imune e inflamatória local.

Outros estudos relataram a presença do novo coronavírus no tronco cerebral, que compreende o sistema cardiovascular primário e o centro do controle respiratório, levantando a possibilidade de que a infecção do sistema nervoso central pode mediar ou agravar problemas respiratórios e cardiovasculares em pacientes com COVID-19.

“Pretendemos fazer, agora, análises do genoma desses pacientes, também disponibilizados no UK Biobank, para identificar quais genes estão mutados e que podem estar implicados no aumento do risco de pessoas com doença de Alzheimer evoluírem para quadros graves e morrerem por COVID-19”, afirma Verjovski.

O artigo Dementia is an age-independent risk factor for severity and death in COVID-19 in patients (DOI: 0.1002/alz.12352), de Ana C. Tahira, Sergio Verjovski-Almeida e Sergio T. Ferreira, pode ser lido na revista Alzheimer’s&Dementia em https://alz-journals.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/alz.12352.

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