Quando os transtornos psiquiátricos afetam a saúde capilar


Os problemas de ordem emocional ou psíquica afetam a saúde capilar e, pelas alterações comportamentais, podem causar danos difíceis de reverter

Com o notável aumento da demanda em atendimentos psiquiátricos em todo o país – a Associação Brasileira de Psiquiatria divulgou que a procura por consultórios superou os 80% antes mesmo do final de 2020 – e a continuidade do período pandêmico as questões emocionais e psíquicas seguem com forte influência na rotina e, em muitos casos, no aspecto geral da saúde. Entre os problemas em que existe essa associação estão males que atingem os cabelos podendo contribuir ou evoluir para a perda permanente de fios.

Para conhecer alguns desses problemas e quais aspectos a serem considerados para um diagnóstico correto, o médico e tricologista Dr Ademir Leite Junior descreve casos que atendeu em seu consultório para alertar às questões psíquicas que se manifestam em comportamentos prejudiciais a outros aspectos da saúde e do bem-estar.

Segundo o especialista, “os casos são pouco frequentes, mas vale a pena cita-los para que esse tipo de conhecimento possa colaborar com pessoas que passam por fases sombrias de desconfianças e medo de problemas desse tipo”.

Dr Ademir relatou quatro casos. Entenda:

1- Pseudoeflúvio psicogênico é um diagnóstico dado a pacientes que cursam com uma queda de cabelo imaginária, uma vez que não se encontra na avaliação clínica nenhum sinal que comprove a presença do quadro. Atendi uma paciente há alguns meses com este quadro com uma duração de mais de duas décadas e experiências com vários colegas que sempre insistiram que ela procurasse ajuda psiquiátrica/psicológica, uma vez que nem do ponto de vista clínico nem do ponto de vista laboratorial havia sinais de que ela sofria de alguma patologia capilar.

2- Tricotenomania é o nome dado à mania de cortar os cabelos de forma constante e como uma resposta a eventos estressantes. Um dos quadros que atendi era de uma paciente que passava por um grande processo depressivo e que cortou todos os cabelos do topo da cabeça com a tesoura, enquanto manteve com comprimento normal cabelos das demais regiões do couro cabeludo. Chegou à consulta dizendo que sofria de queda capilar, mas ao ser examinada apresentava linha de corte (realizada por lâmina ou tesoura), em todos os cabelos da área “acometida”.

3- Ilusão de ferida cutânea, vou chamar assim o quadro da paciente que atendi que está certa de que o topo de sua cabeça apresenta uma ferida que não cicatriza há anos (seria um tipo de transtorno delirante). Ao examina-la esta lesão não existe, mas, por mais que eu tente, a cada nova consulta, mostrar a ela (via tricoscopia), que seu couro cabeludo é totalmente são, a paciente sempre reforça o fato de que a ferida, desde a consulta anterior, segue sem cicatrizar. Por isto, caracterizo este quadro como um transtorno delirante, uma vez que estes transtornos provocam uma incompatibilidade entre a crença do paciente e a realidade. Segundo a paciente, ela já esteve em vários médicos e nenhum deles foi capaz de “cicatrizar” a ferida que ela tem há anos.

4- Tricoteiromania é um quadro pouco comum, mas que vi em um paciente do sexo masculino, que apresentava o quadro na região frontal do couro cabeludo. A fratura dos fios é causada pelo hábito de atritar uma região pilosa com as mãos, unhas ou mesmo algum objeto provocando o quadro. Os cabelos na área se quebram e, muitas vezes apresentam-se com suas hastes lesionadas longitudinalmente formando imagens diversas de pontas duplas, triplas ou até mesmo múltiplas.

Segundo o que explica o tricologista “Mais do que realmente ajudar o paciente do ponto de vista capilar, o olhar para esses quadros deve ser de uma atenção diferente. São pacientes que muitas vezes não percebem o comprometimento da área psíquica, portanto, necessitam de uma abordagem profissional mais exigente e cuidadosa para que o tratamento seja multidisciplinar e eficiente”.

Dr Ademir tem buscado nas formações em psicossomática e psicologia desde 2011 para somar aos conhecimentos médicos e aplicar em seus atendimentos. Ele afirma que esses pacientes necessitam mais do que uma prescrição médica, pois determinados casos são atípicos. “Eles sofrem com a perda de cabelos, mas, mais do que isto, sofrem de transtornos psiquiátricos. Muitas vezes não percebem a gravidade do que estão vivendo e cabe ao profissional ter o cuidado de ouvir, compreender e entender o tempo do paciente para uma indicação de cuidados que envolvam apoio psicológico e, em boa parte das vezes, medicação psiquiátrica para sair do quadro”. Finaliza.

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