Estudo com 26 voluntários avaliou um dispositivo que busca imitar a ação do pâncreas para domar a glicemia. Resultados são promissores, mas exigem mais investigações.
Alexandre Raith, da Agência Einstein
Pesquisadores das universidades de Cambridge, na Inglaterra, e de Berna, na Suíça, testaram o potencial de um dispositivo apelidado de pâncreas artificial em pessoas com diabetes tipo 2 e insuficiência renal. A partir de um sensor que mede a taxa de açúcar no sangue e de um algoritmo em um smartphone, o equipamento portátil usa uma bomba que injeta insulina automaticamente no paciente, quando há necessidade. Em um estudo com 26 pacientes, ele se mostrou mais eficaz para manter a glicemia dentro dos padrões do que a aplicação tradicional desse hormônio, com injeções manuais. Os resultados dapesquisa foram publicados na revista científica NatureMedicine.
Uma espécie pâncreas artificial já havia sido testada em indivíduos com diabetes tipo 1 na Universidade Cambridge. A diferença é que esse novo aparelho funciona de forma totalmente automática. Antes, os pacientes precisavam registrar toda vez que estavam prestes a comerpara o equipamento realizar ajustes na dosagem do hormônio. Agora é o próprio algoritmo do dispositivo que faz isso, com base em medições frequentes da glicemia.
Para o experimento em questão, os cientistas se concentraram em adultos com diabetes tipo 2 que também possuem insuficiência renal. Isso porque o quadro dificulta o controle da glicose. “Pacientes com diabetes tipo 2 e insuficiência renal são particularmente vulneráveis. Há uma necessidade de novas abordagens que os ajudem a manejar suas condições de maneira segura e eficaz”, afirmou em comunicado a pesquisadora Charlotte Boughton, da Universidade Cambridge, que liderou o trabalho.
De acordo com a Federação Internacional de Diabetes (IDF), mais de 80% das doenças renais em estágio terminal são causadas por diabetes ou hipertensão.
Como foi o estudo
Todos os participantes possuíam diabetes tipo 2 e necessitavam de diálise por causa da insuficiência renal. Durante 20 dias, metade utilizou o pâncreas artificial, enquanto o restante seguiu com a aplicação padrão da insulina. Nos 20 dias seguintes, os voluntários trocaram de grupo.
Resultado: durante a utilização do pâncreas artificial, osvoluntários passaram 53% do tempo com a glicemia dentro de padrões aceitáveis. Já com as injeções manuais de insulina, esse número foi de apenas 38%. A taxa média de glicose no sangue também foi mais baixa com o equipamento.
Os cientistas ressaltaram que o algoritmo do pâncreas artificial se ajusta ao organismo de cada indivíduo com o passar do tempo. Ou seja, é possível que os resultados fossem mais positivos com o uso prolongado.
O pâncreas artificial também tornaria o cotidiano dos pacientes mais fácil. Segundo a investigação, 92% dos participantes afirmaram que a tecnologia os fez gastar menos tempo com o tratamento do diabetes tipo 2, seja para aplicar as doses de medicamento, seja para checar as próprias taxas de açúcar no sangue.
No entanto, são necessárias pesquisas mais longas, com um número maior de voluntários e com diferentes tipos e gravidades de diabetes para confirmar os benefícios do pâncreas artificial. No momento, outros grupos também vêm desenvolvendo equipamentos similares — o custo pode ser um impeditivo para o acesso.
“O pâncreas artificial tem o potencial de virar um atributo chave para cuidado personalizado e integrado de pessoas com diabetes e necessidades médicas complexas”, avaliou Lia Bally, médica da Universidade de Berna que participou do estudo.
Mesmo se tudo der certo, ainda deve demorar algum tempo para essa tecnologia chegar à população.