Níveis de consumo de álcool que são considerados seguros em alguns países podem estar ligados a risco mais alto de insuficiência cardíaca. É o que sugere uma pesquisa apresentada no congresso científico da Sociedade Europeia de Cardiologia, Heart Failure 2022.
Os autores do trabalho, do Hospital Universitário de St. Vincent, na Irlanda, concluem que os médicos devem ter uma abordagem mais cautelosa em relação ao consumo de álcool. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a União Europeia é a região com maior consumo de álcool do mundo.
Para minimizar o risco de o álcool prejudicar seu coração, ninguém deve começar a beber, em primeiro lugar. E quem bebe deve limitar seu consumo semanal a menos de uma garrafa de vinho com graduação alcoólica de 12,5%, ou menos de 2 litros de cerveja com graduação alcoólica de 4,5%.
Embora os médicos saibam que o uso pesado de álcool pode causar, a longo prazo, um tipo de insuficiência cardíaca chamada “cardiomiopatia alcoólica”, evidências de populações asiáticas têm mostrado que quantidades menores também podem ser prejudiciais.
Como existem diferenças genéticas e ambientais entre as populações asiática e europeia, a equipe investigou se havia uma relação semelhante entre álcool e alterações cardíacas em europeus com risco de insuficiência cardíaca ou com o quadro. A base do tratamento para esse último grupo é a administração dos fatores de risco, como o consumo de bebida alcoólica, por isso determinar os níveis seguros é algo importante.
Fatores de risco para o coração
O estudo incluiu 744 adultos com mais de 40 anos de idade em risco de desenvolver insuficiência cardíaca, devido a fatores como hipertensão, diabetes e obesidade, ou com pré-insuficiência cardíaca (com fatores de risco e anormalidades cardíacas, mas sem sintomas). A média de idade foi de 66,5 anos e 53% eram mulheres.
O estudo excluiu ex-bebedores e pacientes com insuficiência cardíaca sintomática (que tinham, por exemplo, falta de ar, cansaço, capacidade reduzida de se exercitar e tornozelos inchados). A função cardíaca foi medida com ecocardiografia no início e no fim do estudo.
Os pesquisadores usaram a definição irlandesa de uma unidade padrão de bebida alcoólica, que é 10 gramas de álcool. Os participantes foram categorizados de acordo com sua ingestão semanal de álcool:
- nenhuma;
- baixa (menos de sete unidades, ou até uma garrafa de 750 ml de vinho 12,5%, ou três latas e meia de 500 ml de cerveja);
- moderada (7-14 unidades, ou até duas garrafas de vinho 12,5%, ou até sete latas de 500 ml de cerveja 4,5%);
- alta (acima de 14 unidades, ou mais de duas garrafas de vinho 12,5% ou mais de sete latas de 500 ml de cerveja 4,5%).
Indivíduos acompanhados por mais de 5 anos
Os pesquisadores analisaram a associação entre o uso de álcool e a saúde do coração ao longo de uma média de 5,4 anos.
No grupo de risco, a piora da saúde cardíaca foi a definida como progressão para a pré-insuficiência cardíaca ou para insuficiência cardíaca sintomática. Para o grupo de pré-insuficiência cardíaca, a piora da saúde do coração foi definida como deterioração nas funções de compressão ou relaxamento do coração, ou progressão para insuficiência cardíaca sintomática.
As análises foram ajustadas para fatores que poderiam afetar os resultados, como idade, sexo, obesidade, pressão alta, diabetes e doenças vasculares.
Um total de 201 pacientes (ou 27% da amostra) relatou não fazer uso de álcool, enquanto 356 (48%) eram usuários tinham ingestão baixa e 187 (25%), moderada ou alta. Comparados ao grupo de baixa ingestão, aqueles com uso moderado ou alto eram mais jovens, mais propensos a serem do sexo masculino e com maior índice de massa corporal.
No grupo dos participantes com pré-insuficiência cardíaca, a ingestão moderada ou alta foi associada a um risco 4,5 vezes maior de piorar a saúde do coração quando comparado ao grupo de abstêmios.
No grupo de risco, não houve associação entre uso moderado ou alto de álcool e progressão para pré-insuficiência cardíaca ou insuficiência cardíaca sintomática.
Limites contestados
De acordo com os pesquisadores, as conclusões indicam que beber mais de 70 g de álcool por semana está associado ao agravamento da pré-insuficiência cardíaca ou à progressão para insuficiência cardíaca sintomática.
Eles também não observaram nenhum benefício do baixo consumo de álcool para o coração.
Na Irlanda, pessoas com risco de insuficiência cardíaca ou com pré-insuficiência são aconselhados a restringir a ingestão semanal de álcool a 11 unidades, para mulheres, e 17 unidades, para homens. Mas, pelos resultados do estudo, esses limites deveriam ser bem mais baixos.
O limite atualmente aceito para homens é mais que o dobro do valor que os pesquisadores observaram como seguros.
De qualquer forma, a equipe reforça que são necessárias mais pesquisas em populações caucasianas para alinhar os resultados e reduzir as mensagens contraditórias que médicos e pacientes têm recebido sobre o consumo de álcool.