Entre os principais sinais estão alterações de humor, mau desempenho escolar, ronco e noite de sono agitada; diagnóstico é quase sempre clínico
Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Se o seu filho ronca, tem o sono agitado, dificuldade de concentração e mau desempenho escolar, alterações de humor e passa o dia agitado, atenção: ele pode estar com apneia obstrutiva do sono, um distúrbio bem menos prevalente nas crianças do que nos adultos, mas que se não for diagnosticado e tratado adequadamente, pode causar problemas de saúde, como elevação da pressão arterial e riscos de doenças cardiovasculares, eaté afetar o crescimento da criança. Por isso é importante que os pais estejam atentos, para que o diagnóstico seja feito o quanto antes.
Segundo a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), estima-se que cerca de 10% das crianças roncam e, dessas, de 1% a 3% têm apneia e um sono de baixa qualidade. Em adultos, esse número ultrapassa os 30%. Mas o que é a apneia obstrutiva do sono? “São pausas respiratórias recorrentes que ocorrem enquanto a pessoa dorme, bloqueando a passagem do ar para os pulmões. A pessoa para de respirar um pouquinho e volta. Para e volta”, explicou Leonardo Goulart, neurologista especialista em medicina do sono do Hospital Israelita Albert Einstein.
Goulart explica que a interrupção recorrente da respiração durante o sono tem duas consequências básicas: a primeira é que a oxigenação do sangue fica oscilando, o que coloca o cérebro em alerta. Ao entrar em alerta, o cérebro provoca micro despertares, interrompendo o sono. Uma das várias consequências sistêmicas desse fenômeno pode ser a redução da produção do hormônio do crescimento – o que pode afetar o crescimento adequado da criança. “Essa é uma das questões importantes porque a apneia do sono reduz os níveis do hormônio do crescimento. Tem muitos estudos sobre isso em adolescentes, mas ao tratar a apneia os níveis voltam ao normal”, afirmou o neurologista.
A segunda consequência das constantes pausas na respiração é que o sono se torna insuficiente por ficar muito fragmentado, causando os impactos no dia seguinte, como as alterações de comportamento, irritabilidade e déficit de aprendizado. “Além disso, um outro impacto importante da apneia do sono, que é mais estudado em adultos, mas pode ter impacto em crianças, é a alteração metabólica, com disfunção de hormônios que coordenam o nosso metabolismo, regulam a fome e o armazenamento de gordura. Isso pode levar ao sobrepeso, obesidade e outras alterações”, alertou o médico.
O diagnóstico da apneia é geralmente clínico, mas em alguns casos específicos ele pode ser corroborado pela polissonografia (exame que avalia a qualidade do sono). “[O diagnóstico] Costuma demorar mais tempo do que deveria, mas, cada vez mais, o conhecimento em medicina do sono está se tornando comum na prática médica. Hoje em dia, os pediatras costumam perguntar sobre a qualidade do sono da criança na consulta. O diagnóstico está mais evoluído, mas ainda precisa ficar mais rápido”, pondera Goulart.
Mudanças estruturais para tratamento
O tratamento da apneia na criança é basicamente estrutural. Num primeiro momento, se a criança estiver obesa, perder peso pode ser efetivo. Mudar a posição de dormir também pode ajudar (colocar o filho para dormir de lado e não de costas). Se essas ações não funcionarem, pode ser preciso intervir com cirurgia de remoção das amigdalas e da adenoide (quando for o caso) ou o uso de CPAP (equipamento que empurra o ar para os pulmões por meio de uma máscara ajustada no nariz durante a noite, evitando que ocorram as pausas de respiração no sono).
“Na criança o desenvolvimento facial e o crescimento por si só podem ajudar a diminuir a apneia. Então, o uso do CPAP costuma ser por pouco tempo e logo a criança melhora. A diferença é que o adulto não consegue usar o equipamento por um curto período porque ainda não existe uma outra solução”, ressaltou o neurologista.
Gibi com foco especial para crianças
Para ajudar os pais e as crianças a identificarem o problema, o Instituto do Sono, com apoio da AFIP (Associação Fundo de Assistência à Pesquisa), lançou uma edição no gibi Dona Ciência dedicado ao assunto. A revista tem como objetivo fornecer material de divulgação científica com linguagem simplificada de forma lúdica, com foco especial nas crianças, mas não apenas para elas.
“No Dona Ciência falamos de vários temas da atualidade: vacina de covid, higiene bucal, amamentação. E também falamos da importância do sono, que ocupa um terço das nossas vidas”, afirmou Monica Levy Andersen, diretora de Ensino e Pesquisa do Instituto do Sono e idealizadora da coleção.
A SBPT listou alguns sinais para que os pais observem nos filhos:
- Ronco, que pode ou não ser alto, mas que ocorre todas as noites
- Respiração barulhenta, que piora quando a criança está deitada de costas
- Pausas respiratórias e quando a respiração se reinicia, muitas vezes é com um ronco alto
- Dificuldade de respirar pelo nariz
- Dormir de boca aberta (pode ocorrer de ficar de boca aberta durante o dia)
- Agitação durante a noite, com mudanças na posição de dormir
- Urinar na cama, principalmente se a criança já tinha prévio controle.
“Sempre que o sono da criança for agitado e com barulho, ele precisa ser avaliado por um profissional. Nenhum ronco é normal. Todo barulho, se for recorrente e ocorrer de três a quatro vezes por semana, deve servir de sinal de alerta para que os pais procurem ajuda especializada”, finalizou a otorrinolaringologista Sandra Dória, especialista em medicina do sono e pesquisadora do Instituto do Sono.