Vírus varicela-zóster (VZV) pode ativar cepa HSV-1 do agente infeccioso herpes simplex levando ao acúmulo de proteínas características da doença neurodegenerativa
Segundo estudo publicado no último dia 2 de agosto, na revista Journal of Alzheimer’s Disease, o Alzheimer pode ser causado pela interação entre dois vírus comuns: o varicela-zóster (VZV), causador da catapora e herpes-zóster; e o herpes simplex (cepa HSV-1), que gera a herpes simples.
A pesquisa foi feita por especialistas da Universidade Tufts, nos Estados Unidos, e da Universidade de Oxford, na Inglaterra, utilizando um modelo 3D de cultura de tecidos que imitam o cérebro humano. O experimento mostrou que o vírus VZV pode ativar o HSV-1, levando ao acúmulo de proteínas tau e beta amiloide e à perda da função neuronal — características do Alzheimer.
Depois que alguém já teve anteriormente catapora, a reativação do VZV pode causar a herpes-zóster, uma doença também conhecida popularmente como cobreiro ou zona. Com a infecção de volta, podem ocorrer gatilhos inflamatórios que despertam o agente infeccioso da herpes simples — mais precisamente, a cepa HSV-1, uma das principais variantes do vírus herpes simplex, que fica adormecida dentro dos neurônios do cérebro.
Segundo Dana Cairns, primeira autora do estudo, é possível ainda que outros eventos inflamatórios no cérebro também possam despertar o HSV-1 e levar ao Alzheimer. “Fatores de risco como traumatismo craniano, obesidade ou consumo de álcool sugerem que eles podem se cruzar no ressurgimento do HSV no cérebro”, ela cita, em comunicado.
Conforme David Kaplan, um dos estudiosos que colaboraram com a pesquisa, já suspeitava-se de uma correlação entre o HSV-1 e o Alzheimer. Alguns cientistas sugeriam o envolvimento do VZV, mas não se conhecia a sequência dos eventos que os dois vírus criam para acionar a doença neurodegenerativa. “Achamos que agora temos evidências desses eventos”, ele afirma.
Para entender melhor a relação de causa e efeito entre os vírus e o Alzheimer, os cientistas recriaram ambientes semelhantes ao cérebro em esponjas na forma de rosquinha de 6 milímetros de largura feitas de proteína de seda e colágeno. Então eles povoaram os objetos com células-tronco que se tornam neurônios capazes de transmitir sinais uns aos outros.
Algumas dessas células-tronco viravam até mesmo células gliais, que ajudam a manter os neurônios vivos e funcionando. Com isso, a equipe descobriu que as células nervosas cultivadas podiam ser infectadas pelo VZV. Contudo, isso por si só não levou à formação das proteínas tau e beta-amiloide e as células do sistema nervoso continuaram a funcionar normalmente.
Por outro lado, se os neurônios já abrigavam HSV-1, a exposição ao VZV levava a uma reativação do vírus da herpes simples. A ligação entre esse último e o Alzheimer ocorre quando ressurgem feridas, bolhas e outras condições inflamatórias dolorosas.
A interação gera também um aumento dramático das proteínas características do Alzheimer e uma diminuição dos sinais neuronais. “É um golpe duplo de dois vírus que são muito comuns e geralmente inofensivos”, observa Cairns.
Os pesquisadores notaram que as amostras infectadas pelo VZV começaram a produzir um nível mais alto de citocinas, proteínas que muitas vezes estão envolvidas no desencadeamento de uma resposta inflamatória. Kaplan observou que o causador da catapora e herpes-zóster é conhecido em muitos casos clínicos por gerar inflamação cerebral, o que poderia levar à ativação do HSV-1 dormente.
De acordo com os cientistas, ciclos repetidos de ativação do HSV-1 podem levar a mais inflamação no cérebro, produção de placas e acúmulo de danos neuronais e cognitivos. O uso da vacina contra VZV pode interromper esse ciclo, pois demonstrou em testes reduzir consideravelmente o risco de demência.
Os pesquisadores também observaram os efeitos neurológicos de longo prazo que alguns pacientes com Covid-19 experimentaram do Sars-CoV-2, particularmente entre os idosos, e viram que tanto o VZV quanto o HSV-1 podem ser reativados após uma infecção por coronavírus. Observar os possíveis efeitos cognitivos e na neurodegeneração seria aconselhável nesses casos, eles recomendam.
REVISTA GALILEU