Dra. Lúcia Abel Awad, PhD em doenças infecciosas, responde as dúvidas mais frequentes
uais são as cinco perguntas que os imunologistas e os infectologistas têm que responder com mais frequência? Temas como imunidade, reinfecção, vacina ideal, segunda onda, são bastante recorrentes.
A imunologista professora dra Lúcia Abel Awad, PhD em doenças infecciosas, responde as inquietações e faz um alerta, “ o cenário de segunda onda na Europa pode servir de alerta para o Brasil que deve, neste momento, continuar com as medidas preventivas e de proteção, mesmo que o número de casos e óbitos esteja caindo! Não é hora de flexibilização nem afrouxamento das medidas”
Quanto tempo dura a imunidade contra a COVID-19. Há reinfecção?
Esta é uma pergunta importante sob vários aspectos: como será a resposta frente às vacinas em indivíduos que já tiveram a COVID-19? Uma vez detectados os anticorpos nos indivíduos que estiveram expostos ao vírus, quanto tempo eles irão perdurar na circulação?
De acordo com estudos publicados, a detecção de anticorpos protetores contra o vírus SARS-COV-2, inicia-se no sexto dia após o início dos sintomas e atinge o pico na segunda semana, podendo permanecer em até cinco a seis meses. A presença desses anticorpos anti-SARS-CoV-2 em pessoas infectadas pode variar muito, dependendo dos testes aplicados e em diferentes perfis clínicos. Não sabemos quanto tempo a imunidade protetora pode durar, dada a grande variação de pessoa para pessoa.
É preciso salientar que a reinfecção ou recidiva da COVID-19 não é um episódio comum e precisa ser estudada com mais profundidade. Existem casos de reinfecção no Brasil sendo analisados. Estudos da análise da resposta imune estão sendo conduzidos e acompanhados. É importante ressaltar a importância da análise do sequenciamento do genoma para diferenciar uma nova infecção dos casos de reinfecção. Sabemos que, conforme o título de anticorpos caem, mais são as chances de reinfecção. Entretanto, a doença tem se mostrado mais amena em alguns casos, sem apresentação de quadros graves, o que poderia ser explicado por uma forte resposta imune celular mediada por linfócitos T da exposição anterior. Por essa razão podemos observar poucos casos de reinfecção na Covid-19.
Por que que dentro de uma mesma família, uma pessoa se contamina e apresenta sintomas, e outra não, e nem sequer apresenta anticorpos?
O vírus SARSCOV-2, responsável pela COVID-19, está se mostrando atípico com diversas particularidades, que estão sendo estudadas e observadas por pesquisadores no mundo todo. Estudos mostram que em determinadas situações, os anticorpos são produzidos em quantidades muito pequenas e desaparecem muito rapidamente da circulação. Várias pesquisas com acompanhamento de famílias verificaram que as transmissões dentro do núcleo familiar, e mesmo pessoas assintomáticas que tiveram contato com familiares doentes, os anticorpos não são detectados, mas é possível verificar a presença de uma resposta imune mediada por células T CD4+ e T CD8+. Isso quer dizer que, mesmo sem anticorpos, essas pessoas podem estar protegidas contra a infecção. Outro ponto importante é que o fato de termos sido expostos a outros vírus da família do coronavírus no passado, pode ter gerado um repertório de células T e B de memória, desencadeando o fenômeno chamado de reatividade cruzada.
A situação está sendo investigada por vários grupos de pesquisa no Brasil e no mundo. No caso da dengue, por exemplo, se formos infectados pelo mesmo sorotipo, estaremos imunes. Entretanto, se a nova infecção por dengue ocorrer por um vírus da dengue de outro sorotipo, isso pode desencadear a dengue hemorrágica. Essa é uma das razões que ainda não temos uma vacina para a doença.
No caso da vacina pelo novo coronavírus, é esperado que ela seja capaz de induzir uma proteção duradoura e eficaz, independente do repertório de células T e B e exposição prévia do indivíduo.
Qual será a vacina ideal?
Frente à grande variação na produção de anticorpos, as apostas para a melhor vacina contra a COVID-19 estão nas soluções que também são capazes de induzir uma resposta imune mediada por linfócitos T CD4+ e T CD8+, capazes de conferir proteção eficaz e duradoura. A vacina capaz de induzir uma resposta de células T de memória com uma forte resposta de produção de anticorpos neutralizantes será a vacina mais promissora.
A detecção da presença de anticorpos neutralizantes é crucial. Outros estudos apontam que a reatividade cruzada poderá benéfica. Ainda assim precisamos entender melhor como essa imunidade funciona.
A via de administração da vacina intranasal deve ser considerada e pesquisada, sendo capaz de gerar uma resposta imune robusta de células CD4 + Th1 de memória nas vias aéreas.
A segunda onda chegará aqui no Brasil?
Os números da pandemia na Europa e nos Estados Unidos estão preocupando as autoridades quanto à uma possível segunda onda no Brasil. Após uma nova explosão de casos, os governos da Alemanha e da França anunciaram um lockdown parcial para conter a segunda onda da doença. A Rússia também vem registrando aumento do número de casos e óbitos. Esse cenário pode servir de alerta para o Brasil que deve, neste momento, continuar com as medidas preventivas e de proteção, mesmo que o número de casos e óbitos esteja caindo! Não é hora de flexibilização, nem afrouxamento das medidas. Uma segunda onda no Brasil não está descartada.
Quando as vacinas estarão disponíveis para a população?
De acordo com o andamento dos estudos com as vacinas em fase 3 aqui no Brasil, ainda vai levar algum tempo para analisarmos o número de casos de COVID-19 entre os voluntários vacinados. Somente a partir daí é que saberemos, de fato, qual vacina funcionará melhor e, a partir disso, seguir com o pedido de registro da vacina. Entretanto, já podemos ter um planejamento de logística e de distribuição, com vistas, em breve, ao processo de vacinação em massa.