Manter menina na escola é fator protetivo; baixa escolaridade e renda, além do fato de viver com o companheiro, aumentam risco.
Por Gabriela Cupani, da Agência Einstein
Quase 1 em cada 5 adolescentes gestantes volta a engravidar antes de chegar à vida adulta, mostra uma pesquisa que avaliou dados de mais de 4,5 mil grávidasentre 12 e 19 anos em todo o Brasil. O estudo investigou os fatores que levam à reincidência na gestação nessa idade e foi feito pela Universidade Federal do Espírito Santo a partir de informações do estudo “Nascer no Brasil”, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
A taxa de nova gestação nessas meninas é de 18,6% e a enorme maioria não foi planejada e desejada. Jovens com baixa escolaridade e renda são as mais expostas ao problema. Aquelas que moram com o companheiro têm uma chance duas vezes maior de engravidar novamente.
Por outro lado, o risco de reincidir cai 23% a cada ano que se consegue adiar a gravidez. “A escolaridade é um fator protetivo e quanto mais ela fica na escola, mais atrasa a maternidade”, enfatiza a enfermeira Thamara de Souza Campos Assis, uma das autoras. “Isso dá um sentido pra vida delas, de realizar sonhos e ter metas.”
Nessa idade, também há chance de mais complicações na gravidez, como hipertensão, pré-eclâmpsia e eclâmpsia, parto prematuro e bebês com baixo peso ao nascer.
“Como o corpo ainda está em amadurecimento, pode até haver um déficit calórico pelas demandas do próprio organismo da adolescente e da gestação. Não é o momento para uma sobrecarga”, explica o ginecologista e obstetra Mariano Tamura, do Hospital Israelita Albert Einstein. Além disso, a falta de maturidade traz outros problemas: “Elas procuram menos atendimento, não seguem as orientações corretamente e acabam fazendo um pré-natal de pior qualidade”, observa.
Falha no acesso à saúde reprodutiva
“Os resultados mostram a dificuldade de acesso ao planejamento familiar e à saúde reprodutiva das adolescentes”, diz Thamara. Às vezes elas têm vergonha de assumir que já iniciaram a vida sexual ou não encontram acolhimento na família e nos serviços de saúde.
“Após terem filhos, muitas acabam assumindo essa função na sociedade pois isso já define um rumo e fecha outras possiblidades”, completa Tamura.
Mas não faltam meios de evitar uma gravidez indesejada e não há nenhuma contraindicação ao uso de contraceptivos nessa idade, como as pílulas. Para quem costuma esquecer de tomar o comprimido, uma boa opção são os implantes hormonais. O DIU (dispositivo intrauterino) atualmente também tem uma versão mini. O mais importante é procurar um médico antes mesmo de começar a vida sexual, que vai orientar essa escolha.
“Esse tema pode e deve ser abordado em qualquer consulta, mesmo com outros especialistas, se a paciente estiver mais à vontade com outro profissional”, diz Tamura. Mas vale lembrar que a visita ao ginecologista é essencial quando há queixas ou sintomas menstruais, ou sinais de infecção, como corrimento ou ardência.Campeão de gravidez adolescente
Apesar de uma ligeira queda nos últimos anos, o Brasil ainda tem uma das maiores taxas de gravidez na adolescência da América Latina. Só em 2020, foram cerca de 380 mil partos de mães com até 19 anos – cerca de 14% de todos os nascimentos no país, segundo dados do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para a Saúde (CIDACS-Fiocruz).
Em 2018, eram 15,5% no país. Para se ter uma ideia: no Peru e na Costa Rica a taxa é 11%; na Argentina e no Uruguai, 10%; e no Chile, 5%. Esses dados são Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), a agência que trata de saúde sexual e reprodutiva.
Embora o fenômeno atinja todas as classes sociais, é mais frequente nas mais vulneráveis. São elas que também sofrem o maior impacto, tanto no acesso à saúde quanto na perda de oportunidades.