Devemos tomar banho todos os dias? Especialistas dizem que não; saiba os motivos


Dermatologistas defendem que o hábito diário, além de ressecar a pele, pode remover as bactérias que fazem bem para o corpo

Um contingente de renegados deliberadamente renuncia ao banho diário e a outros padrões-ouro de higiene pessoal, como lavar o cabelo com xampu e uso de desodorante, desafiando uma cultura de limpeza.

Para os convertidos a esta opção de estilo de vida, há muitas razões para se banhar menos e ficar com um cheiro mais natural.

— Não precisamos nos lavar como fazíamos quando éramos agricultores. Desde o advento dos carros e das máquinas que economizam trabalho, nunca precisamos lavar menos e, em vez disso, lavamos mais — afirma Katherine Ashenburg, 65, autora de “The Dirt on Clean: An Unsanitized History” (A Sujeira no Limpo: Uma História Não-Higienizada, traduzido do inglês).

A retenção dos óleos naturais da pele e a conservação da água são duas razões usadas como explicação para não tomar banho diariamente. Alguns concluíram que o desodorante é desnecessário depois de esquecê-lo uma vez sem repercussões sociais, ou estão preocupados com antitranspirantes contendo alumínio, embora tanto o Instituto Nacional do Câncer quanto a Associação de Alzheimer não compartilhem dessas preocupações. Lavar o mínimo possível com xampu pode ajudar a reter a umidade em mechas secas e melhorar a forma dos cachos, argumentam os adeptos da prática.

Resista ao desejo de recuar diante deste grupo: eles podem estar no caminho certo. Ultimamente, os pesquisadores descobriram que, assim como o intestino contém boas bactérias que o ajudam a funcionar com mais eficiência, nossa pele está repleta de germes benéficos que talvez não queiramos mandar pelo ralo.

— Boas bactérias estão educando suas células da pele para fazer seus próprios antibióticos e elas produzem seus próprios antibióticos que matam as bactérias ruins — explica Richard Gallo, chefe da divisão de dermatologia da Universidade da Califórnia, em San Diego.

Algumas pessoas há muito reclamam que tomar banho demais deixa a pele mais seca ou mais propensa a surtos de eczema, e Gallo disse que os cientistas estão apenas começando a entender o porquê.

— Não é apenas a remoção dos lipídios e óleos da pele que a resseca. Você pode estar removendo algumas das boas bactérias que ajudam a manter um equilíbrio saudável da pele — afirma o dermatologista.

Mas Elaine Larson, professora da Escola de Enfermagem da Universidade de Columbia com Ph.D. em epidemiologia, alertou que os passageiros do metrô, frequentadores de academias e outros que entram em contato com muitos estranhos devem considerar se ensaboar.

— Se é temporada de gripes e resfriados, você vai querer se livrar das coisas que não fazem parte de seus próprios germes normais — afirma.

Seja qual for a motivação, a limpeza pessoal nos Estados Unidos tem sido um grande negócio. Os anúncios generalizados abordam (e possivelmente geram) a ansiedade sobre o odor corporal.

Adultos com menos de 24 anos usam desodorante e antitranspirante mais de nove vezes por semana, mas mesmo para grupos etários mais velhos, o uso nunca cai abaixo da média de uma vez por dia, de acordo com a Mintel, uma empresa de pesquisa de mercado. Noventa e três por cento dos adultos do país usam xampu quase diariamente, disse a empresa. Estatísticas confiáveis ​​sobre a frequência com que os americanos tomam banho são difíceis de encontrar, como explica Regina Corso, vice-presidente sênior da Harris Poll, uma empresa de pesquisa.

— As pessoas vão hesitar em dizer que não estão tomando banho todos os dias — disse ela.

Mas Todd Felix, um ator de aparência limpa e produtor online da Sony que mora em Los Angeles, ficou feliz em relatar que considera desodorante desnecessário e antitranspirantes absurdos. Para ele, o último é semelhante a cobrir os poros com uma embalagem de plástico.

Para manter seu odor corporal sob controle, ele toma um banho diário com um sabonete líquido sem perfume, geralmente depois da academia. Mas Felix, que está na casa dos 30 e não quer ser tachado como um hippie, é cauteloso ao revelar que não usa proteção nas axilas para as pessoas com quem sai.

— Quando você diz a uma pessoa que não usa desodorante, você se depara com “Oh, que europeu, que natural, que descolado”.

As poucas vezes que Felix mencionou em um encontro que ele fica sem desodorante, ele disse, as coisas rapidamente se tornaram bem azedas. (O Sr. Felix admitiu que vive horrorizado por ter o raro dia fétido).

— É estranho, mas eu não cheiro. Então, o comentário é sempre: “Você acha que não cheira mal” — ele conta.

Mas Matt Merkel, um engenheiro de Birdsboro, Pensilvânia, tem certeza de que cheira bem. Como? Recentemente, Merkel, de 29 anos, disse à mãe e à irmã que desistiu do desodorante quando adolescente, e elas ficaram chocadas.

— Eu estava tipo, “Me cheire , eu não me importo!”— disse a elas, acrescentando: — Elas provavelmente pensavam que eu ainda tinha 13 ou 14 anos e fazia isso porque alguém me disse para fazer isso.

O costume americano de limpeza rigorosa estava em pleno andamento na Segunda Guerra Mundial, quando a maioria das casas adquiriu um banheiro completo, disse Ashenburg, e intensificou-se com os esforços de marketing do pós-guerra. Mas os padrões são relaxantes, pelo menos em alguns cantos. Um artigo na edição de novembro da revista Parenting sugere que mães estressadas não precisam tomar banho diariamente.

— O ar é mais seco no inverno, o que significa que você precisa dos lubrificantes naturais da sua pele — ela afirma.

Mais ousadamente, em uma página de fãs no Facebook para o livro “Run Like a Mother” (Corra Como Uma Mãe, traduzido do inglês), uma bíblia para pais ativos fisicamente, Bethany Hoffmann Becker, de 32 anos, de Hutto, Texas, relata sua rotina:

— Eu faço minhas corridas na hora do almoço no trabalho, então depois eu uso lenços umedecidos. Eu só tomo banho antes de ir para a cama.

No mundo profissional, alguns jovens aspirantes não se preocupam com suor ou mal odor.

— Não me sinto mais fedido do que qualquer outro cara, e conheço muitas pessoas que dizem a mesma coisa. Nunca me falaram que estou fedendo. Quando digo às pessoas que não uso desodorante, elas ficam surpresas ao ouvir isso — conta Blake Johnson, 25, um candidato à faculdade de direito que acabou de se mudar para Norman, cidade dos Estados Unidos.

Johnson, um banhista comum que se parece com o falecido cantor Elliott Smith, também confessou que deixa seu cabelo desgrenhado ficar oleoso para poder penteá-lo do jeito que quiser.

John Wesley Wilder Jr., 30, vendedor de uma loja de óculos na Filadélfia, não é apenas um convertido ao cabelo não lavado — ele lava apenas uma vez por mês para reduzir o frizz — mas também ao que se poderia chamar seu perfume pessoal.

— Eu estava me acostumando a não cheirar como Old Spice (desodorante famoso nos EUA) e cheirar como eu — relatou Wilder, que renunciou à proteção nas axilas por três anos.

No entanto, a onda de calor do verão passado o forçou a reconsiderar.

— No momento em que não tomei banho, foi terrível — relembra.

Agora ele ocasionalmente usa um desodorante natural.

De fato, aqueles que tentam não se preocupar com a higiene, precisam se preparar para o feedback negativo. Tara Freymoyer, 26, gerente de propriedade em Birdsboro, desistiu da proteção nas axilas depois que começou a namorar Merkel, um abstêmio.

Ela tem amigos que “torcem o nariz” e dizem: “Você é nojenta”. Mas Freymoyer persiste, pelo menos em parte por causa de seu medo de que o antitranspirante possa causar câncer.

— Só para minha saúde pura. Quem se importa se eu feder um pouco? — questiona.

JORNAL O GLOBO

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