Estudo da UFRN identifica substâncias sintéticas não declaradas em suplemento


Juliana Estevam – Agecom/UFRN

A pesquisa mais acessada do Repositório Institucional (RI) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) expõe um alerta sobre a segurança de produtos vendidos como naturais: muitos podem conter substâncias sintéticas sem aviso no rótulo. É o caso do Infinity 12, um suplemento oral indicado para dores crônicas, cuja fórmula inclui ingredientes como cálcio de ostra, dolomita, canela-de-velho, castanha-da-índia e chapéu-de-couro.

O estudo, cujo título é Infinity 12: mais um produto dito natural adulterado que contém substâncias sintéticas não declaradas, foi realizado como trabalho de conclusão de curso pela estudante Maria Isabel Dutra Fonseca, no curso de Farmácia da UFRN, e identificou a presença de paracetamol no produto — composto sintético com potencial hepatotóxico, quando consumido em excesso por longos período. A pesquisa foi  conduzida no Laboratório de Farmacognosia, pelo grupo Produtos Naturais Bioativos (PNBio), e já soma mais de 15 mil acessos em 10 países, entre eles Brasil, Estados Unidos, Irlanda, Costa Rica e Suécia.

O artigo teve mais de 22 mil visualizações e 1204 downloads até fevereiro de 2025 – Imagem: Repositório Institucional

Também foi identificada a presença de piroxicam, anti-inflamatório não esteroidal (AINE) usado para o tratamento de dores e inflamações. Embora eficaz, seu uso requer cautela devido ao risco de efeitos colaterais, como irritação gástrica e comprometimento da função renal. A presença dessa substância no suplemento reforça as preocupações sobre adulteração  de produtos ditos naturais e os potenciais riscos à saúde dos consumidores.

A pesquisa teve início após a solicitação de uma médica geriatra do Hospital Universitário Onofre Lopes (Huol), que observou uma melhora significativa em um paciente com dores crônicas após o uso do suplemento. A eficácia inesperada despertou suspeitas quanto à verdadeira composição do produto, levando à análise laboratorial.

Para a investigação científica, foram empregadas técnicas de cromatografia para avaliar a composição do suplemento. Os testes de cromatografia em camada delgada (CCD) permitiram identificar a presença de anti-inflamatórios não esteroidais, comparando o perfil cromatográfico das cápsulas com padrões de paracetamol, piroxicam, trometamol e diclofenaco sódico. Além disso, análises de cromatografia líquida de ultra eficiência (Clue), acopladas a um espectrômetro de massas de alta resolução, confirmaram a presença de paracetamol no produto.

Esse trabalho ganha relevância em um contexto de crescente consumo de produtos naturais no Brasil, frequentemente impulsionado pela crença de que são inofensivos. No entanto, como aponta o estudo, embora tenha ampla fiscalização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em relação aos medicamentos fitoterápicos, esse tipo de produto é comercializado como natural, mas contém substâncias sintéticas não declaradas no rótulo que podem representar sérios riscos à saúde.

Impacto e riscos à saúde

De acordo com a pesquisadora Silvana Maria Zucolotto, orientadora do estudo, esse tipo de produto representa um risco à saúde pública. Isso porque o consumo excessivo de substâncias como os AINEs pode ser perigoso, especialmente para pessoas alérgicas ou que fazem uso de medicamentos contínuos e, ainda, com quadro de gastrite ou úlcera.

Pesquisadora Silvana Zucolotto é orientadora do estudo – Foto: Cícero Oliveira

Zucolotto também alerta para os perigos da automedicação. “Muitas pessoas já utilizam medicamentos de uso contínuo para doenças crônicas e, sem saber, acabam consumindo um produto, pensando ser natural, à base de extratos vegetais, quando na verdade contém substâncias sintéticas. Isso pode levar a interações indesejadas com os medicamentos que o paciente já utiliza”, explica.

A professora ainda reforça a necessidade de diferenciar fitoterápicos regulamentados de produtos adulterados. “Os fitoterápicos são medicamentos registrados na Anvisa, com comprovação de segurança, eficácia e qualidade. Esse tipo de produto acaba prejudicando a imagem dos fitoterápicos que, ao contrário do Infinity 12, são submetidos a uma legislação rigorosa para ter sua comercialização autorizada no país ”, destaca.

Por que a pesquisa é a mais acessada?

A popularidade da pesquisa pode ser explicada pelo crescente interesse da sociedade na segurança de produtos naturais. Segundo a autora, o estudo tem como base três pontos principais: segurança e saúde; proteção, alerta e conscientização do consumidor; e a necessidade de uma vigilância mais rigorosa contra essa prática de adulteração.

A partir da comparação do tempo de retenção com os padrões e das massas dos íons presentes analisados, foi possível confirmar a presença de paracetamol no produto comercializado – Imagem: Maria Isabel Dutra Fonseca

O trabalho inspirou outros estudos no mesmo segmento, como Análise de diferentes lotes do produto Infinity 12 adquirido por meio do mercado digital, do pesquisador Clebson da Silva Melo, que, apesar de ter sido publicado seis meses depois, tornou-se a décima pesquisa mais acessada no repositório institucional da UFRN.

Nesse novo estudo, também orientado por Silvana Zucolotto, foram analisados lotes variados do Infinity 12 e identificada variabilidade entre os diferentes eles, indicando inconsistências na produção e falta de controle de qualidade, apresentando diferentes compostos sintéticos em cada um.

Os trabalhos foram amplamente divulgados nas redes sociais do grupo de pesquisa PNBio, que já é reconhecido por suas investigações sobre adulterações em produtos comercializados como naturais. Além da repercussão digital, as pesquisas também foram publicadas na Revista Flora, um periódico de divulgação científica da Sociedade Brasileira de Farmacognosia. Com uma linguagem mais acessível, a publicação ajudou a ampliar o alcance dos estudos, contribuindo para o alto número de acessos e reforçando a importância da fiscalização rigorosa desses produtos.

Revisão: Ana Byatriz Moreira

UFRN

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *