Estudo revela ligação inesperada entre dieta e câncer de pulmão


Cientistas identificaram que excesso de açúcar pode favorecer crescimento das células cancerígenas no órgão

Para muitos tipos de câncer, como de estômago, de intestino e de fígado, o papel da alimentação para aumentar, ou reduzir, o risco é mais claro e estabelecido. Não à toa, há diretrizes que orientam medidas como limitar o consumo ultraprocessados e priorizar itens in natura. Mas um novo estudo mostra que podem haver mais diagnósticos oncológicos ligados ao que se coloca no prato.

O trabalho, conduzido por pesquisadores da Universidade da Flórida, nos Estados Unidos, olhou para outro órgão em busca de uma relação entre dieta e o desenvolvimento de tumores: o pulmão. Os resultados, publicados nesta sexta-feira na revista científica Nature Metabolism, apontam um mecanismo pelo qual uma má alimentação pode elevar o risco de um adenocarcinoma, quando o câncer surge nas células dos tecidos epiteliais glandulares, de pulmão.

“O câncer de pulmão não é tradicionalmente considerado uma doença relacionada à dieta. Doenças como câncer de pâncreas ou câncer de fígado, sim. Quando se trata de câncer de pulmão, a ideia de que a alimentação pode desempenhar um papel é raramente discutida” afirma Ramon Sun, professor da universidade, onde também dirige o Centro de Pesquisa Espacial Avançada de Biomoléculas, em comunicado.

A equipe por trás do novo estudo afirma que essa é uma das primeiras evidências a encontrar tal associação, ao menos que tenha sido publicada por um dos centros designados pelo Instituto Nacional de Câncer dos EUA para estudos da área, ou seja, instituições de maior prestígio no meio da pesquisa oncológica.

Para encontrar a ligação, os cientistas utilizaram métodos avançados de análise molecular a partir de uma plataforma criada por Sun em 2020. Segundo o pesquisador, a técnica oferece “uma nova lente para visualizar doenças, permitindo discernir padrões moleculares e interações anteriormente desconhecidas, com um nível impressionante de detalhamento e profundidade de entendimento”.

No caso específico do adenocarcinoma pulmonar, que responde por 40% dos diagnósticos de câncer de pulmão no mundo, os americanos decidiram estudar se um mecanismo chamado de acúmulo de glicogênio, que pode ser influenciado pela alimentação, teria uma influência. Isso porque o glicogênio, uma macromolécula que armazena glicose (açúcar), já foi encontrado em níveis elevados em diversos tipos de câncer.

Ao mapear os estoques de glicogênio no pulmão, os pesquisadores observaram que a macromolécula de fato atuava como um metabólito oncogênico, o que eles descreveram como um “pirulito gigante para o apetite do câncer por açúcar”. Eles explicam que quanto mais glicogênio nas células cancerígenas, maior e mais agressivo pode ser o tumor.

A partir daí, os cientistas decidiram testar se uma dieta rica em açúcar, que favorece o aumento do glicogênio no organismo, poderia influenciar o câncer de pulmão. Para responder a essa pergunta, eles alimentaram camundongos com uma “dieta ocidental”, rica em gordura e glicose. Os achados mostraram que o aumento dessa ingesta fez o tumor crescer.

“A longo prazo, nossa abordagem para a prevenção do câncer deve espelhar o sucesso da campanha antitabagismo — com maior ênfase na conscientização pública e em estratégias orientadas por políticas que promovam escolhas alimentares mais saudáveis como componente fundamental da prevenção de doenças”, defende Sun.

“Priorizar uma dieta rica em nutrientes, manter um estilo de vida ativo e minimizar o consumo de álcool são estratégias fundamentais para a saúde a longo prazo. Estimular hábitos alimentares melhores pode ser uma ferramenta poderosa na prevenção do câncer de pulmão”, complementa Matthew Gentry, professor e chefe da disciplina de Bioquímica e Biologia Molecular da Faculdade de Medicina da Universidade Flórida, que participou do estudo.

Jornal O Globo

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