Além dos tradicionais exames de colesterol, glicemia e hipertensão, os de enzimas hepáticas e creatinina podem ajudar a definir melhor o risco cardiovascular
Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
Quando é feito um exame de sangue de rotina para avaliar a saúde do coração, os primeiros resultados que as pessoas conferem são os que apontam os níveis de colesterol (que indica o risco de aterosclerose e, consequentemente, o de infarto) e a hemoglobina glicada, que vai sinalizar o risco de desenvolver diabetes tipo 2, que é um fator de risco cardiovascular bastante conhecido. Mas existem outros indicadores importantes para a saúde cardíaca, que muitas vezes são deixados de lado, mas podem ser úteis para determinar mudanças de estilo de vida e até abordagens clínicas para a prevenção. São eles: colesterol não-HDL, creatinina, enzimas hepáticas (TGO e TGP) e lipoproteína(a).
Os médicos normalmente costumam monitorar pelo menos cinco itens para avaliar o coração: colesterol, glicemia (níveis de açúcar no sangue), peso corporal ou medida da cintura (para determinar obesidade), hipertensão arterial e, mais recentemente, a qualidade e duração do sono. “Esses são os itens clássicos para uma avaliação cardiovascular de rotina. Além, é claro, de perguntas como: fuma? Já fumou? Faz alguma atividade física? Quais seus hábitos alimentares?”, explica o cardiologista Humberto Graner, coordenador do Pronto-Atendimento do Hospital Israelita Albert Einstein de Goiânia.
Segundo o médico do Einstein, há algum tempo a literatura tem apontado que não são apenas a hipertensão, o colesterol elevado, o diabetes, a obesidade ou o sono ruim que aumentam o risco de doenças cardiovasculares e, por isso, é preciso olhar para outros parâmetros, outros marcadores, para conseguir fazer uma avaliação mais global do paciente.
“É o que chamamos de fatores de risco cardiovasculares emergentes. Temos cada vez mais informações que colocam esses exames [colesterol não-HDL, creatinina, enzimas hepáticas (TGO e TGP), lipoproteína(a)] quase como obrigatórios na avaliação de um paciente quando pensamos em promover a saúde cardiovascular e diminuir os riscos”, afirmou. Entenda a seguir a importância de cada um deles.
Colesterol não-HDL: o colesterol é um tipo de gordura que, quando está em níveis adequados, é essencial para o funcionamento do nosso organismo. O exame de sangue calcula o colesterol total e frações: LDL (colesterol ruim) e HDL (colesterol bom). O exame colesterol não-HDL nada mais é do que pegar a medida do colesterol total e subtrair o colesterol bom (HDL).
Segundo Graner, esse indicador tem ganhado mais importância do que olhar isoladamente os níveis do colesterol LDL (colesterol ruim) porque existem outros fragmentos que também podem aumentar o risco cardiovascular, mas não aparecem explícitos no exame de sangue.
“Antes achávamos que havia apenas essa dicotomia, colesterol bom e colesterol ruim, como se tivéssemos que olhar apenas esses dois elementos. Mas existem outras partículas, gorduras, lipoproteínas e até o próprio triglicérides, que também podem causar o risco cardiovascular. E qual a melhor forma de determinar isso? Você calcula o colesterol total e tira somente o colesterol bom. O que sobra é o que não é bom, o que sobra é o colesterol não-HDL. As pesquisas têm apontado cada vez mais que esse é um parâmetro muito mais sensível e fidedigno do risco cardiovascular”, explicou o médico do Einstein.
Lipoproteínas: a lipoproteína(a), também conhecida pela abreviação Lp(a), é um tipo de partícula presente no sangue, similar ao colesterol LDL (ruim), que também se acumula nas artérias e aumenta o risco cardiovascular. Mas trata-se de um fator genético e não causado por fatores de estilo de vida. Segundo Graner, a lipoproteína(a) é única devido à sua estrutura específica. “Essa particularidade faz com que a Lp(a) tenha comportamentos distintos no corpo, em comparação com outras lipoproteínas”, disse o especialista.
A Associação Americana do Coração estima que cerca de uma em cada cinco pessoas em todo o mundo tem níveis elevados de lipoproteína(a). De acordo com o cardiologista, estudos recentes têm mostrado a associação independente da lipoproteína(a) com o risco aumentado de doenças cardiovasculares, além dos fatores tradicionais, como colesterol alto, hipertensão e diabetes. Assim, sua medição poderia ser um fator único identificável para descobrir pessoas com risco elevado de doença cardiovascular.
“Até pouco tempo atrás, não tínhamos nem como dosar essa molécula. Agora temos esse exame disponível e a recomendação é que ele seja dosado pelo menos uma vez na vida de um paciente adulto para estimar o risco cardiovascular, especialmente para aqueles com forte histórico cardiovascular. Como ela é determinada geneticamente, não existem intervenções para reduzi-la. Mas ela serve como um importante marcador de risco cardiovascular, que vai acompanhar o paciente por toda a vida”, explicou.
Creatinina: o nível de creatinina, um resíduo formado pela digestão de proteínas, é um marcador da função renal e é um exame bastante comum – embora não seja muito usado para a análise de risco cardiovascular. Graner destaca que esse não é um marcador novo, mas a monitoração da função renal é extremamente importante para avaliar a saúde do coração. “Há uma troca entre o coração e os rins muito frequente. Um paciente que sofre do coração pode ter problemas renais, e vice-versa. Daí a importância de monitorarmos a creatinina. Pacientes com problemas cardiovasculares chegam a ter três ou quatro vezes mais riscos de desenvolver complicações renais”, alertou.
Enzimas hepáticas (TGO e TGP): os testes para enzimas hepáticas, conhecidas como TGO e TGP, podem indicar uma função hepática prejudicada ou depósitos de gordura prejudiciais à saúde no fígado. “Essas enzimas refletem a saúde do fígado fundamentalmente por causa de um elemento que tem ganhado cada vez mais holofotes, que é a esteatose hepática não alcoólica, popularmente chamada de ‘gordura no fígado’. Dificilmente recebemos no consultório alguém que não tenha nenhum grau de gordura infiltrando o fígado”, disse o cardiologista. O problema é que esse acúmulo de gordura no fígado – chamado de esteatose hepática – é um distúrbio metabólico importantíssimo, que está cada vez mais associado a riscos de problemas no coração.