Mais de 80% das pessoas com colangite biliar primária (CBP) relatam fadiga intensa como principal sintoma
Em 2005, o cansaço e a falta de disposição tomaram conta da rotina de Célia Recupero, hoje com 65 anos. “Levantar da cama de manhã para atender o telefone, ir ao supermercado ou, até mesmo, assistir um filme com meus filhos, era um grande desafio. Eu não conseguia. Sentia um cansaço muito forte”, relembra Célia que, na época, atribuiu a fadiga a sua rotina agitada e até cogitou um possível diagnóstico de depressão.

Crédito: Acervo pessoal Célia Recupero
A jornada até o diagnóstico, que explicaria esses sintomas, começou em uma consulta ao dentista em que um exame de sangue mostrou alterações em uma enzima do fígado. Mas a confirmação veio apenas um ano depois: colangite biliar primária.
“Durante esse período de cansaço extremo, acabei quebrando o meu dente. Para o procedimento de restauração, o dentista me solicitou exame de sangue. No resultado, a enzima fosfatase alcalina estava alta e poderia indicar alguma alteração no fígado”, conta Célia. Em 2007, ela iniciou o acompanhamento com um clínico geral que solicitou uma série de exames, mas nenhum foi capaz de identificar a causa do problema. Após cerca de um ano, foi recomendado pelo médico a realização de uma biópsia do fígado que confirmou o diagnóstico de colangite biliar primária (CBP).
Após quase 20 anos convivendo com a CBP, Célia conseguiu controlar a doença e superar a fadiga extrema graças ao acompanhamento com hepatologista e ao cuidado adequado. “A CBP me trouxe desafios, mas sou grata em ter tido acesso a especialistas e a um tratamento eficaz que me permitiram ter mais qualidade de vida”, conclui.
Diagnóstico precoce e cuidado adequado são essenciais
De acordo com a hepatologista Débora Terrabuio, a colangite biliar primária é uma doença hepática autoimune, crônica, rara e progressiva, em que o sistema de defesa do corpo ataca os pequenos canais que conduzem a bile dentro do fígado. “Com o tempo, esses canais acabam sendo destruídos, podendo causar a diminuição ou interrupção do fluxo de bile do fígado para o intestino (colestase), inflamação hepática e fibrose. O diagnóstico precoce e o cuidado adequado são fundamentais para evitarmos complicações mais graves como cirrose ou necessidade de transplante de fígado”, explica a especialista.
A fadiga relatada por Célia é um dos sintomas mais debilitantes da CBP, afetando até 80% dos pacientes. Segundo a médica, um fator marcante da fadiga é o seu caráter persistente, intenso e sem causa aparente. “Diferentemente do cansaço normal, a fadiga não melhora com descanso ou mudanças simples de rotina. Quando acompanhada de alterações em exames do fígado, coceira, olhos e boca secos, ou histórico de doenças autoimunes, deve levantar a suspeita de problema hepático e motivar investigação médica”, adiciona a hepatologista.
A CBP atinge por ano cerca de 1,7 a cada 100 mil pessoas no mundo, sendo mais frequente em mulheres. Segundo a especialista, a causa da doença não é exata, mas há uma combinação de fatores genéticos, etários e ambientais que podem estar associadas, como a exposição a certas substâncias químicas (como tabaco, esmaltes e tintura de cabelo), infecções (principalmente de trato urinário) e alterações na microbiota intestinal.
Embora a CBP não tenha cura, existem tratamentos que permitem maior controle da doença e melhora da qualidade de vida do paciente. De acordo com a hepatologista, um deles é o elafibranor. “Esse medicamento é o único agonista PPAR de nova geração aprovado pela Anvisa no Brasil, mas infelizmente ainda não está incorporado no Sistema Único de Saúde (SUS) para tratamento da doença”, finaliza.


