Cientistas investigam caso de paciente que parece ter sido protegido por uma rara alteração genética que melhorou a função de uma proteína que ajuda as células nervosas a se comunicarem
Pesquisadores que buscam desvendar os segredos da doença de Alzheimer dizem ter recebido uma pista importante que pode ajudar a proteger as pessoas em risco desse tipo de demência.
Um homem que parecia fadado a desenvolver perda de memória em seus 40 ou 50 anos, com base na história familiar, manteve a função normal por décadas a mais do supostamente que deveria. Ele parece ter sido protegido por uma rara alteração genética que melhorou a função de uma proteína que ajuda as células nervosas a se comunicarem.
Os cientistas dizem que entender como essa mudança genética defendeu o cérebro do paciente pode ajudar a prevenir o mal de Alzheimer em outras pessoas.
O homem faz parte de uma grande família em Antioquia, na Colômbia, com muitos membros que herdaram um gene mutante chamado presenilina-1, ou PSEN1. Os portadores de PSEN1 quase certamente desenvolverão a doença de Alzheimer em uma idade relativamente jovem.
O homem, que tinha a mutação PSEN1, acabou desenvolvendo problemas de memória e pensamento. Ele foi diagnosticado com demência leve aos 72 anos, depois experimentou mais declínio de memória e uma infecção. Ele morreu de pneumonia aos 74 anos.
Mas, ao que tudo indica, ele deveria ter desenvolvido problemas de memória e raciocínio décadas antes. Quando os médicos examinaram seu cérebro após a morte, descobriram que ele continha beta-amiloide e tau, duas proteínas que se acumulam no cérebro de pessoas com Alzheimer.
No entanto, ele também tinha algo trabalhando a seu favor. Uma análise genética revelou que o homem tinha uma rara alteração em um gene que codifica uma proteína chamada reelina, que ajuda as células nervosas a se comunicarem.
“Neste caso, ficou muito claro que esta variante da reelina faz com que a reelina funcione melhor”, disse Joseph Arboleda-Velasquez, professor associado de oftalmologia da Universidade de Harvard e principal autor de um novo estudo sobre o homem.
“Isso nos dá uma visão enorme”, disse ele. “Isso torna muito óbvio que apenas colocar mais reelina no cérebro pode realmente ajudar os pacientes”.
O estudo foi publicado na segunda-feira (15) na revista Nature Medicine.
Proteção
A proteína reelina aprimorada parecia estar protegendo uma parte muito específica do cérebro do homem, uma área que fica atrás do nariz na base do cérebro chamada córtex entorrinal.
“Outro grande insight deste caso é que parece que talvez você não precise disso em todo o cérebro”, disse Arboleda-Velasquez.
O córtex entorrinal é particularmente sensível ao envelhecimento e ao mal de Alzheimer. É uma área do cérebro que também envia e recebe sinais relacionados ao olfato. A perda do olfato costuma ser um prenúncio de alterações cerebrais que levam a dificuldades de memória e pensamento.
“Assim, quando as pessoas têm Alzheimer, ela começa no córtex entorrinal e depois se espalha”, disse Arboleda-Velasquez.
Esta é a segunda vez que Arboleda-Velasquez e a equipe que estuda essa família extensa encontram alguém que desafia suas probabilidades genéticas.
Em 2019, os cientistas relataram o caso de uma mulher que deveria ter desenvolvido Alzheimer precoce, mas manteve sua memória e habilidades de pensamento até os 70 anos.
Ela carregava duas cópias de uma alteração em seu gene APOE3 que foi apelidada de mutação de Christchurch. Parece ter diminuído a atividade da proteína APOE3. Como a reelina, a APOE é uma molécula sinalizadora conhecida por desempenhar um papel na formação do risco de Alzheimer de uma pessoa.
E acontece que existe uma ligação entre esses dois casos: os receptores nas células para reelina são os mesmos receptores para APOE.
“Portanto, esses dois pacientes estão apontando como grandes setas. Eles estão nos dizendo: ‘Ei, este é o caminho. Este é o caminho que é importante para proteção extrema contra a doença de Alzheimer’”, disse Arboleda-Velasquez.
Mas o caminho pode não ser tão protetor para todos. A irmã do homem no novo estudo também compartilhou a rara mudança genética protetora, e isso a ajudou, mas não tanto. De acordo com sua família, ela começou a apresentar declínio cognitivo aos 58 anos.
Arboleda-Velasquez disse que pode ser porque nas mulheres, a atividade do gene parece cair com a idade, então não produz tanta proteína reelina. “Elas podem ter a variante, mas não a expressam tanto quanto os homens”, disse ele.
A equipe de Harvard diz que já está trabalhando para desenvolver uma terapia baseada nessas descobertas.
O pesquisador Richard Isaacson, neurologista preventivo da Florida Atlantic University, diz que estudos como este mostram algo importante: “Em certos casos, podemos vencer um cabo de guerra contra nossos genes.”
Isso significa que uma cura está chegando? Isso continua a ser investigado.
“Podemos usar um estudo como este para transformar o atendimento e melhorar o atendimento? Espero que sim. Não diria que chegamos lá ainda”, disse Isaacson, que não participou da pesquisa. “Mas acho que este é um estudo importante.”
CNN BRASIL