Medicação foi aprovada pela Anvisa, mas é de alto custo; pacientes do SUS continuam sem opção farmacológica
Por Fernanda Bassette, da Agência Einstein
No início deste ano o tratamento da obesidade ganhou mais uma arma: a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso do medicamento Wegovy (semaglutida 2,4 mg) para sobrepeso e obesidade no país. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que cerca de 20% dos brasileiros estão acima do peso, o que coloca a obesidade como um problema crônico de saúde pública. Estudo feito com Wegovy apresentou resultados bastante promissores. Mas como esse medicamento age no organismo?
A semaglutida é um medicamento familiar para algumas pessoas. Ela foi aprovada pela Anvisa em 2018 para o tratamento do diabetes tipo 2 (Ozempic), mas em doses menores (máximo de 1 mg). Por causa dos bons resultados observados na perda de peso, essa medicação vinha sendo usada “off label” para pessoas com obesidade. Os resultados de um amplo estudo internacional, realizado com mais de 2.000 pacientes e publicado no New England Journal of Medicine, mostraram uma perda de peso em torno de 17% nos pacientes que receberam uma injeção semanal da semaglutida (além de orientações sobre dieta e exercícios físicos) – algo considerado excepcional para um tratamento farmacológico, já que com os outros remédios disponíveis o paciente costuma atingir um platô quando ele perde cerca de 10% do peso.
Ela atua de forma semelhante a um hormônio produzido no intestino, que é o GLP1. Toda vez que uma pessoa se alimenta, esse hormônio sinaliza para o cérebro que é hora de reduzir a fome e retardar o esvaziamento do estômago. Além disso, ela melhora o funcionamento da insulina no organismo, levando à maior sensação de saciedade após uma refeição farta. Sua ação dura uma semana no organismo.
“A semaglutida tem uma ação semelhante à da liraglutida (Saxenda), com a diferença de que a semaglutida é de administração semanal e liraglutida é de administração diária. É uma medicação que não tira o prazer de comer, mas ela leva a uma maior saciedade”, explicou o endocrinologista Márcio Mancini, chefe do Grupo de Obesidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. “Junto com mudanças nutricionais e atividade física, ela torna o tratamento da obesidade mais eficaz”, frisou.
Segundo Mancini, o fato de a dosagem indicada para obesidade ser maior pode implicar em um pouco mais de efeitos colaterais, como náuseas, eventualmente vômitos e demora para o esvaziamento gástrico. “Mas são efeitos contornáveis. Essa é uma medicação que tem um escalonamento de doses, que vai sendo aumentada no decorrer das semanas apenas quando o paciente tolerar aquela dose. Por isso que é ruim a automedicação”, destacou o médico. A aplicação da injeção da semaglutida no tratamento da obesidade é semanal, o que é importante para a adesão ao tratamento.
Assim, a semaglutida se soma às outras medicações disponíveis hoje no combate à obesidade (sibutramina, orlistate e liraglutida), com a diferença no valor do custo mensal do tratamento – o valor da medicação ainda não foi definido, ainda depende da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, mas deve girar em torno de R$ 1.000 por mês. “A sibutramina também leva a mais saciedade, mas os estudos não mostram uma eficácia tão grande na perda de peso. Mas ela é bastante útil porque o tratamento mensal com a sibutramina gira em torno de R$ 50”, lembrou Mancini.
SUS não tem nenhum medicamento
Mancini destacou ainda que embora a semaglutida tenha ótimos resultados para o paciente obeso, a aplicabilidade na prática deve ser para poucas pessoas, já que no SUS ainda não há nenhuma medicação para tratar obesidade. “No SUS temos eventualmente orientação nutricional para a população. O SUS só oferece cirurgia bariátrica, com filas que têm lista de espera de anos. Chegar a semaglutida no SUS é um sonho. Não deve chegar nem a longo prazo”, afirmou.
A indicação da semaglutida é para a pessoa com obesidade. Ele pode ser um medicamento de primeira escolha, mas, segundo Mancini, o principal filtro para o paciente é o custo e esse é um medicamento muito caro. “É uma boa medicação para pacientes que têm contraindicação para receber sibutramina, por exemplo, ou que não responderam ao orlistate”, finalizou.