— Perguntei a ele: “Quantas vezes já fez isso antes?” — contou Tayler Monroe, mãe do menino. — Ele respondeu: “Bem, já fiz isso em cinco leitões.”
Tayler e o marido, Nick, aceitaram o risco. Em 22 de abril de 2022, após oito horas de cirurgia, o Dr. Turek realizou o primeiro transplante parcial de coração bem-sucedido em um bebê. Owen tinha apenas 17 dias de vida e um coração do tamanho de um morango.
Owen é uma das menos de 50 pessoas no mundo submetidas a esse tipo de operação, que oferece uma nova forma de reparar defeitos cardíacos graves com tecido vivo. A maioria foi realizada na Duke, e um estudo publicado na quarta-feira no Journal of the American Medical Association apresenta a primeira análise sistemática do procedimento, acompanhando Owen e outros 18 pacientes com idades de dois dias a pouco mais de 30 anos.
Grande parte dessas cirurgias ocorre em formato “dominó”: um paciente recebe um coração novo, e o órgão substituído, embora doente, fornece válvulas em boas condições para outros pacientes, explicou Turek.
Os pesquisadores verificaram que as válvulas transplantadas se mantêm saudáveis e, nos bebês, chegam a crescer com o corpo. Mas o período médio de acompanhamento foi de apenas seis meses, e não há dados conclusivos sobre a durabilidade a longo prazo.
Nos Estados Unidos, mais de 2.000 crianças e 100.000 adultos aguardam na fila por transplantes. Órgãos de doadores são escassos, e muitos são descartados por não servirem para transplantes completos — um problema crescente, como já noticiado pelo New York Times.
Segundo o Dr. Taufiek Konrad Rajab, cirurgião cardiotorácico do Hospital Infantil do Arkansas, cerca de 43% dos corações de doadores infantis ou jovens adultos não são aproveitados. Se fossem usados para transplantes parciais, poderiam salvar muitas vidas, afirmou.
Válvulas cardíacas que crescem com o paciente
Hoje, cirurgiões podem substituir válvulas defeituosas por próteses mecânicas, tecido de cadáver ou de animal. Nenhuma dessas opções, porém, cresce com a criança, obrigando pacientes a passar por três a cinco cirurgias até a vida adulta, explicou Rajab. Cada operação subsequente se torna mais complexa devido ao acúmulo de tecido cicatricial e requer parada cardíaca, com risco de lesões graves e morte.
Os transplantes parciais oferecem uma alternativa: válvulas vivas, capazes de crescer junto com o paciente. No estudo recente, nove bebês acompanhados por cerca de um ano apresentaram válvulas que dobraram de tamanho. Embora não se saiba se esse crescimento continuará, os resultados são promissores, disse o Dr. Kevin Daly, diretor médico de transplante cardíaco do Hospital Infantil de Boston.
Todos os transplantes exigem medicamentos para suprimir o sistema imunológico, o que aumenta o risco de infecções graves e danos renais. Mas, nos transplantes parciais, a equipe da Duke reduziu essas doses para cerca de um quarto do normal, explicou Turek.
O caso do bebê Kix Soderblom reforça o potencial do método. Um mês após o transplante, ele precisou interromper a imunossupressão devido a uma infecção não relacionada. Apesar do risco, sua válvula continuou crescendo, sugerindo que talvez não seja necessário manter imunossupressão ao longo da vida.
— É cedo para conclusões definitivas — alertou o Dr. David Kalfa, chefe de cirurgia cardiovascular do Hospital Infantil Nicklaus, em Miami. Em outra análise, oito pacientes apresentaram anticorpos contra a válvula doada, o que pode comprometer a função do órgão. São necessários mais estudos para definir a dose ideal de imunossupressores — ou até para saber se as válvulas realmente sofrem rejeição.
Embora o crescimento da válvula não seja tão relevante em adultos, os transplantes parciais também podem beneficiá-los. Válvulas biológicas se desgastam e precisam ser trocadas a cada 15 anos, enquanto válvulas vivas podem durar mais tempo e se autorreparar. Já as válvulas mecânicas exigem uso vitalício de anticoagulantes, o que complica a gravidez e limita atividades físicas intensas, explicou o Dr. William Hiesinger, cirurgião da Stanford Health Care.
Além das válvulas: um futuro promissor
Até agora, o procedimento tem sido aplicado para corrigir defeitos valvares, mas a mesma técnica pode ser usada para vasos cardíacos e até para uma câmara inteira do coração.
— Em teoria, é possível transplantar quase qualquer parte do coração — disse Rajab.
Ainda assim, a técnica é experimental. Menos de dez hospitais nos EUA oferecem o transplante parcial, e ainda não há protocolos consolidados sobre como selecionar doadores, monitorar possíveis rejeições ou realizar a cirurgia da forma mais segura.
Enquanto a medicina busca respostas, Owen cresce saudável. Hoje, com 3 anos e meio, “vive a melhor vida possível”, disse Tayler Monroe. Ele adora montar torres de blocos, brincar com o pai e correr pela casa gritando. Na segunda-feira, começou a pré-escola.
— Ele vai ser engenheiro quando crescer — disse a mãe, sorrindo.
Os Monroes sabem que Owen é o primeiro grande teste desse tipo de transplante. Ninguém sabe quanto tempo suas válvulas durarão.
— Mas não pensamos no negativo — afirmou Tayler Monroe. — Somos imensamente gratos por cada momento com ele.
NEW YORK TIMES