Venda de antidepressivo cresce 17% na pandemia


Medo do novo coronavírus, mudanças na rotina, incertezas e o isolamento social estão entre fatores que levaram mais pessoas aos consultórios de psiquiatras; desânimo e alterações no sono são sinais de alerta

Um levantamento inédito do Conselho Federal de Farmácia (CFF) apontou um aumento de 17% nas vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor em 2020, primeiro ano da pandemia de covid-19, em relação a 2019. Medo da infecção pelo novo coronavírus, mudanças na rotina, incertezas e o isolamento social estão entre fatores que levaram mais pessoas aos consultórios de psiquiatras, que alertam sobre a necessidade de observar sintomas como alterações no sono, ansiedade e desânimo, e de buscar ajuda ao sentir impactos na saúde mental.

“Verificamos o consumo nos períodos de 2018 em relação a 2017, 2019 a 2018, 2020 a 2019. Este último levantamento teve um aumento significativo de venda de remédios para transtorno de humor e psicotrópicos de 17%. Em 2019, tinha sido de 12% e, em 2018, de 9%. Isso mostra o impacto da pandemia na saúde mental das pessoas”, explica Wellington Barros, consultor do CFF e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

O levantamento, feito em parceria com a Consultoria IQVIA, mostrou ainda um ranking dos Estados que mais tiveram aumento de venda desses medicamentos durante a pandemia. O Amazonas lidera com incremento de 29%. Na sequência, estão Ceará (29%) e Maranhão (27%). São Paulo é o 18º colocado, com aumento de 16%.

“Muitas pessoas imaginariam que São Paulo, por ser um Estado extremamente afetado pela pandemia, lideraria, mas sabemos também dos recortes dos determinantes sociais. A literatura médica mostra a prevalência de distúrbios de saúde mental em locais com desigualdade e pobreza. A vulnerabilidade aumenta a prevalência de ansiedade e depressão”, avalia Barros.

Ele afirma que os momentos mais críticos da pandemia, desde a escassez de respiradores chegando à crise da falta de oxigênio para pacientes, também têm impacto na saúde mental da população.

Membro da diretoria da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Marcelo Feijó explica que o aumento de problemas psiquiátricos por causa da pandemia já era previsto não só no Brasil, mas em todo o mundo.

“Mundialmente, já era sabido que teria a quarta onda da pandemia relativa à saúde mental. A primeira seria a da covid-19. A segunda, das pessoas que têm complicações por causa da doença. Depois, a das pessoas que têm problemas cardíacos, câncer, e que deixaram de buscar tratamento. A última é a de saúde mental. Medo da doença, isolamento, situação da economia levam a esse aumento. Nos consultórios, as pessoas estão falando que estão trabalhando bastante, há aumento de tentativa de suicídio. É bem preocupante.”

Segundo Feijó, que também é professor de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Faculdade de Medicina do Hospital Israelita Albert Einstein, o estigma em relação ao tratamento psiquiátrico tem diminuído ao longo dos anos, mas ainda há alguns gargalos.

“É necessário pedir ajuda, porque as medicações são controladas e é preciso ter uma receita dada por um médico, mas a maior parte das prescrições não é feita por especialistas. Na classe média, as pessoas vão mais à terapia e tomam medicação. Só que existe uma lacuna entre as pessoas que têm o problema e as conseguem o acompanhamento e ainda houve a interrupção de serviços durante a pandemia. Estima-se que 60% das pessoas que têm problemas psiquiátricos não recebem o tratamento adequado.”

A estudante Ana Luiza de Sá, de 26 anos, já estava com sintomas de depressão em janeiro do ano passado e viu a situação se agravar durante a pandemia. “Quando comecei a tomar remédio, a pandemia começou. Não tinha mais o mesmo apoio, porque é diferente conversar por telefone e ter alguém para abraçar. Tive de trocar a medicação e passar pela adaptação de novo.”

Terra.com.br

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